segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Distrito 9 e Substitutos

-Eu estava lendo que existem inúmeras espécies ameaçadas de extinção pela devastação da natureza que o homem promove. As vezes acho que a maior prova de que existem formas de vida inteligente no universo é que nenhuma delas tentou entrar em contato conosco até hoje.

Calvin - o "peste" genial de Bill Watterson

Distrito 9



O pior do humano é mostrado em Distrito 9 (District 9, 2009). Quando humanos brancos e negros (perdão pelo qualificativo, mas a coisa piorará, e muito) são postos frente à uma espécie equiparada à humana intelectualmente (ao menos na média, não na "casta superior", vide o filme), unem-se no preconceito, na exploração e até no extermínio (de preferência, colocando os nigerianos junto).

Atenção: se tivéssemos evoluído de monotremos, quebrar os ovos de meus irmãos seria, acredito, uma decisão de meus pais, e não do fiscal de saúde.

Distrito 9, portanto, além de obviamente ser uma monstruosa (e aqui o termo não é pejorativo) metáfora sobre o apartheid, é uma obra de profundo pessimismo, de um descrédito no humano coletivo, e na redenção (além da mutação) de seu personagem central.

Uma lição a ser dada que inicia pelo revoltar-se contra usar outro ser vivo como alvo em testes e termina por um presentear com uma flor feita de sucata.

A obra é tão poderosa que nem me preocupo em tratar dos magníficos efeitos, da concepção tecnológica soberba (o exoesqueleto militar simplesmente vale o filme- ainda mais capturando projéteis bem melhor, e de maneira mais convincente, que os poderes de Neo, de Matrix). Nem perderei meu tempo em discutir viagens interestelares, relatividade e outros pormenores de crítica científica. Muitos outros filmes já tiveram estes detalhes destruídos e analisados ao pó por mestres.

O objetivo de Distrito 9 não é ser exato, mas preciso em ser contundente, e sua ferida, acredito, será cicatriz que por muitos será por muito tempo lembrada.

E que venha Distrito 10 (talvez com este nome mesmo) e que os "camarões" nos "desçam o cacete", e nos ensinem pela dor a sermos mais humanos, ao menos com outros seres humanos.

PS - Para ter-se idéia da capacidade do diretor Neill Blomkamp e sua já presente influência, recomendo assistir estes vídeos:

O curta metragem que deu origem a Distrito 9

Alive in Joberg

Um ensaio seu, com todas as características de uma pretensa filmagem do clássico do anime Ghost In The Shell

Adicolor Yellow

E aqui, uma amostra da escola que já desenvolveu em produção de ficção científica:

HALO MOVIE: FIRST 8 MINUTES

Substitutos



Tenho de admitir: sou viciado em filmes do estilo "antecipação" ( o estilo/ divisão da ficção científica que trata de nuances de nosso futuro provável dentro do acréscimo de novos elementos tecnológicos ou paradigmas).

Um bom exemplo é o hoje um tanto extemporâneo "Estranhos Prazeres" (Strange Days, 1995), com os quais Substitutos (Surrogates, 2009) guarda intimidade.

Em Estranhos Prazeres, as pessoas vivenciam as memórias com as sensações de outras. Em Substitutos, as pessoas vivem suas sensações com corpos que não são os seus, e inclusive, não são nem corpos propriamente ditos, mas robôs, andróides, "substitutos".

Sinceramente, duvido muito que viciados em adrenalina vão querer que robôs ligados a seus cérebros saltem de paraquedas ou participem de competições de skate, ou mesmo surfem até tranquilamente em praias calmas. Mas o que é assustador no filme é a possibilidade de homossexuais masculinos gordos mórbidos ganhem corpos de modelos de roupa de baixo para se divertir e me convidem para uma vodka num balcão de um bar.

Só isso seria um motivo com imensos desdobramentos em outras combinações que levariam tal paradigma de modo de vida a não ser facilmente disseminado. Notem que disse disseminado, com o o filme o trata, como um vício epidêmico (e até pandêmico, como o filme o apresenta), mas não que venha a ocorrer e se usado, até massivamente.

O filme explora um lado mórbido do humano: apesar dos corpos e rostos serem (aparentemente) lindos (pois não o são realmente nem corpos orgânicos), as mentes que que os operam não o são, e os corpos reais, orgânicos, os "controladores", muitas vezes, compelidos por tais mentes, são depressivos, melancólicos, apresentam a degradação da inatividade, o talvez subentendido vício em drogas e uma agorafobia epidêmica (sem falar de uma certa apatia), que permeia o contexto da imensa maior parte da humanidade naquele universo ficcional.

PAUSA - Este dias talibãs foram mortos por avião robô.

Aqui, o filme acerta na mosca (imagem ridícula, concordo). No filme, a tecnologia nasce na área militar, e este será exatamente seu berço, e tão certo como os passos mostradops na evolução da tecnologia que abrem o filme, e são reais (documentais), os soldados robóticos comandados por soldados controladores confortavelmente deitados em um salão serão fatos, e tal marcha, já foi dada pelos aviões comandados à distância por pilotos segura e confortavelmente sentados próximos de seus lares.

Sobre tal tema, de maneira similar, já abordei a saga Exterminador do Futuro, e a marcha para tal é a mesma que leva um filme de 2009, permitir que Bruce Willys tenha cabelos loiros com um topete de gosto um tanto duvidoso, esteja uns 20 anos mais jovem, mais magro do que jamais esteve e inclusive, corra e salte sem um braço, e encaremos tal como realista, natural e até diria perfeito.

Se o representável na tela é fruto do computacional, e o computacional produz o militar, os talibãs (e seus sucessores) ou outros combatentes opositores à tecnologia militar de 20 anos no futuro deveriam começar a repensar seus paradigmas agora, antes de serem obrigados a enfrentar garotos tão preocupados em levar um tiro ou serem vítimas de uma explosão como hoje estão os adolescentes ao jogar qualquer videogame de guerra.

O que marca - mesmo sendo o que chamo de um "filme menor" - Substitutos é o envolvimento de dramas humanos profundos, como a artificialidade de um relacionamento homem-mulher por avatares mecânicos, a impossibilidade do humano mesmo fechado entre quatro paredes transcender o que seja o pior do humano e a transposição para "novos vícios", nem que seja agora na forma de choques elétricos.

Mas não acredito de forma alguma numa utópica redução de crimes, pois afinal, provavelmente os "manos" de São Paulo (ou similares de qualquer cidade) agora tentariam coisas ainda mais audazes, pois a dor sempre foi um impecilho para a criminalidade, a menor dor que leva no filme a que quando sairmos de nossas casas, seremos submetidos a um determinado nível de stress, a uma certa ansiedade, e no filme, pela vida em tanto doentia para a qual se direcionou o ser humano naquele universo ficcional, ao nível do pânico.

Aqui, filosofo um tanto, e lembro que um dos úteis mais úteis dos sentimentos humanos é o medo.

É a ausência do medo que se faz crianças pequenas correrem riscos mortais em peitoris de janelas, e exatamente o medo que leva racionalmente um agente policial de elite a só entrar numa sala com um homem armado sob todas as condições de segurança, ou um paraquedista a só saltar com um paraquedas muito bem examinado, ou um montanhista a só subir uma montanha com todo o treinamento, bem guiado e quipado, com minucioso planejamento.

Não devemos confundir medo com pânico, e ausência de medo com imprudência.

O medo (aliás, este medo assim definido) advém exatamente da capacidade do cérebro humano primeiro guardar experiências, além de calcular comportamentos futuros. E sinceramente, nosso cérebro gosta de nossos corpos e suas sensações. Aliás um dos objetivos de Andrew Martin o personagem robótico de O Homem Bicentenário (Bicentennial Man, 1999), história original do grande Isaac Asimov, que busca ao longo de sua longa vida somar ao seu intelecto as sensações humanas.

Aqui, completo citando outro filme de antecipação que também é um "filme menor", mas igualmente toca no inexorável do desenvolvimento científico-tecnológico: O 6º Dia (The 6th Day, 2000). Haverão robôs comandados completamente e simulando humanos. Haverão robôs que serão literalmente humanos, e até superiores a estes intelectualmente e em termos de aptidões físicas (aliás, o que não é grande proeza). Haverão (e já há, em determinados níveis) ciborgues, humanos melhorados e recuperados por máquinas. Haverão clones humanos. Pois ao que parece, já pilotamos aviões a distância, existem computadores que jogam xadrez melhor que qualquer humano e linhas de montagem de fábricas, e ninguém pode impedir um casal de ter uma réplica genética de um jovem filho perdido implantado m um de seus óvulos. Evitando, talvez, temores como os de O Enviado (Godsend, 2004) e reproduzir gênios do mal (ainda mais "aquele", com idéias repetidas no apartheid e logo, em Distrito 9) como em Os Meninos do Brasil (The Boys from Brazil, 1978).

E nestas diversas coisas, haverão questões morais, mas nenhuma pode ser encarada como imoral pura, simples e "pré-conceituosamente"*.

*Aqui, a grafia errônea se fez necessária.

Algumas das brilhantes publicidades de Substitutos:

Nenhum comentário: