sexta-feira, 23 de abril de 2010

Alices no planeta dos vulcões

Uma jornada trágica entre os perigos que nos rondam
e aqueles que ocultamos

Inicialmente, expliquemos que entre determinado grupo de minha geração originalmente em Porto Alegre diz-se "Acorda Alice!" com um tom jocoso quando percebe-se que determinada pessoa esteja perdida em devaneios, sonhos impossíveis ou altamente improváveis ou não percebendo determinada coisa óbvia. A gíria é mais que adequada para tratar muito do que cerca o humano, hoje e sempre, em inúmeros campos.



Homem, um animal naturalmente esperançoso

Os recentes acontecimentos na Europa, colocando no chão durante dias todos os aviões, trouxe a tona uma coisa que pode ser resumida pela frase de uma moça entrevistada num dos aeroportos (aproximadamente): - A natureza mostrando que não somos nada (sic) frente à ela.

Claro que em meio ao pronunciado nestas semanas, houveram pérolas de ignorância sobre a questão como as destacadas por jornalista como "Isto é a natureza se revoltando contra nós" ou "a natureza se vingando".

Não façamos argumentos "antiteleológicos" (isto dá outro artigo por si), mas deixemos bem claro que o que pode se tornar pejudicial, ao passar para determinado regime com nossa presença, o que poderíamos chamar de "vingança", são sistemas ecológicos, e até em grande escala, o clima, como a grande quantidade de evidências pelo nosso despejo de dióxido de carbono e outros gases de efeito estufa tem levado a crer. Somos, como já tratei aqui, uma força geológica, mas ainda nossa ação é apenas isto que aí está. As demais forças geológicas em muito nos ultrapassam.

Os geologismos, e nestes os vulcanismos, sempre ocorreram. Existe uma imagem um tanto errônea, provavelmente oriunda da paleontologia da virada do século XIX para o XX nos EUA, que mostra os dinossauros em imagens com vários vulcões em atividade ao fundo, talvez por diversas descobertas que mostravam grande atividade vulcânica nas agora agradáveis e tranquilas paisagens da América do Norte, coincidentemente com as descobertas de fósseis. Houveram ainda sim, longos períodos de grande atividade vulcânica, assim como também devastadoras erupções, iguais a nenhuma outra registrada em nossa História.



Tanto no passado quanto recentemente, se representam dinossauros e outras formas de vida, quando não com erros de morfologia, com erros nos ambientes.


Mas no âmago da questão, o motor geológico terrestre e sua atividade está como sempre esteve, ativo e tentando seguidamente exterminar as bactérias sobre sua superfície, mesmo as mais complexamente modificadas.

O vulcão Eyjafjallajoekull, com todo o estrago e prejuízos que fez, nada mais é que um soluço comparado a vulcanismos do passado e potenciais, dispersos pelo planeta. As erupções do século XVIII e XIX, como a do Laki (1783-1784), na própria Islândia, e a dupla do barulho do Oceano Índico Tambora (1815) e Krakatao (ou Krakatoa, como queiram, 1883) foram realmente erupções que causaram problemas, desde grande número de mortes diretas e locais até mortes por modificação de clima em continentes. Percebamos que o século XX passou, apesar de nosso explosivo crescimento populacional, ao largo de tal escala de eventos. Provavelmente, como a estatística não é mais que estatísticas mas é cruel apontadora de tendências, estamos na proximidade por simples distribuição de mais um evento de grande escala.


Crateras de Tambora, Toba, Santorini (Thera) e Krakatoa. Estas imagens não estão na mesma escala, variando as crateras de 4 a 80 km nas maiores medidas.

Mas tem-se de perguntar qual a escala. Erupções do passado, nem tão remoto, mais que estudadas, como Toba (um irmão maior do turbulento Oceano Índico), que levaram a humanidade a um gargalo populacional de no máximo 10000 casais, e na Índia, não mais de 600, por base em estudos genéticos. Claro que hoje enfrentaríamos uma crise climática global não mais com lanças e pedras polidas, mas também não enfrentaríamos de maneira mais que o precário a obstrução do Sol e invernos de anos mesmo com nossos tratores e colheitadeiras, e fertilizante e insetida algum aqui teria serventia.

Como foi solucionado precariamente na Europa nos "anos sem verão" - correspondendo a 'invernos vulcânicos', teríamos de alimentar centenas de milhões com cogumelos, insetos e caramujos, e pintemos com todas as letras que estas soluções, em meio à criminalidade explosiva, prostituição epidêmica e desordens de todos os tipos, como saques e rebeliões, mesmo em pacíficos, sofisticados e ordeiros países como a Suíça, exatamente o país de há pouco produzira gênios como Euler, e mesmo em tempos logo após Newton e Lavoisier, em um continente onde já haviam as bases da industrialização, com nomes como Watt entre suas fundações. Noutras palavras, as correspondentes escalas de soluções que tinham os líderes do século XVIII e XIX, teríamos de prover para os bilhões que hoje temos de habitantes.



A convecção do manto terrestre, a tectônica de placas e as hot spots, mecanismos que leva a Terra a invariavelmente apresentar vulcanismos.


Mas os geologismos são capazes de "obras" maiores. Basta ver os supervulcões, que somente há pouco tempo na vulcanologia são relativamente bem entendidos. Supervulcões são perfeitamente entendíveis como de difícil tratamento pela geologia do passado porque são tão grandes que não mostram aquela silhueta "Vesúvio" característica. Sua capacidade de produzir materiais para a atmosfera é entendida quando se cita que Taupo, na Nova Zelândia, em erupção de 26 mil anos atrás, expeliu estimados 430 km³ (uma quantidade de material que compactado formaria um cubo de 7 e meio quilômetros de aresta, uma altura maior que a dos maiores vulcões ativos hoje). O gigante Yellowstone, região ativa ao ponto de ser o parque com as atrações que é, em sua última erupção, há 600 mil anos, expeliu 1000 km³.



Escalas comparativas dos materiais expelidos nas erupções. Uma erupção de 10 km³ de expelidos, como a do Monte Santa Helena e de uma erupção de 1000 km³ de um supervulcão.


Só para se entender a diferença, a cratera de Tambora tem 8 quilômetros de diâmetro. Thera, a grande erupção que destruiu a civilização minóica (~1620 AC), apresenta uma cratera que na maior medida alcança 12 km. A cratera de Toba mede pelo menos uns 30 a 40 x 80 a 100 km (eu já a medi grosseiramente em imagens de satélite), sendo o maior lago vulcânico do mundo, e seu domo é a maior 'ilha dentro de outra ilha' do mundo.

Para entender isto num quadro mais amplo, recomendo ler sobre Índice de Explosividade Vulcânica.

Nem falemos de erupções cujas evidências limitam muito o seu estimar, como o conjunto que participou dos mecanismos da extinção Permiano-Triássica há 250 milhões de anos, com eliminação de 95% das espécies, pela liberação de quantidades catastróficas de dióxido de carbono na atmosfera, como as Siberian Traps, cobrindo 7 milhões de km² e tendo de 1 a 4 milhões de km³ em volume de derrames, com cada uma das erupções passando de 2000 km³ de material expelido e durante um processo de até citados 1 milhão de anos de atividade. Similares são as Deccan Traps, que concorrem hipoteticamente - ainda que não preferencialmente - com o impacto de Chicxulub como causa da extinção Cretáceo-Terciária, a popular extinção dos dinossauros.

Entendo os processos desta escala quando visito a Serra gaúcha, ou o Paraná, e vejo camadas de basalto de até 6 metros (pelo menos algumas que já medi) ou na região de Lages, em Santa Catarina, com suas camadas de ardósia oriunda de cinza vulcânica.



Deccan Traps e a Serra gaúcha.


Mas digamos que num tempo próximo controlemos erupções de pequena escala. Na verdade, já contornamos determinados efeitos das erupções, como os derrames de lava, como já feito por água do mar e por obras civis (simples valas), desviando os fluxos respectivamente na Islândia e na Itália. Ainda que controlemos erupções da escala do Eyjafjallajoekull, ainda não controlaremos as imediatamente superiorem em VEI.

Se não controlamos ainda toda a geologia, não controlamos os processos que podem nos prejudicar gravemente. Mas não controlaremos, ao controlar totalmente a geologia, os processos astrofísicos, como a agregação dos corpos celestes, a acreção. Acreção, aqui, é uma palavra simples para rochas do tamanho de nossas montanhas que caiam na Terra a velocidades de dezenas de quilômetros por segundo, e sem nem ao menos estar havendo uma única erupção prejudicando turismo e viagens de negócio e trabalho, tornem a temperatura da atmosfera em poucas horas mais altas que o forno onde assamos um peru, um dos sobreviventes da última colisão catastrófica na Terra.

Assim, se controlarmos, todos as colisões possíveis, sejamos capazes de evitá-las, ainda sim não controlaremos os processos do Sol, que em última instância, será a fonte de energia para deter estes processos prejudiciais todos. Logo, também, não controlaremos, a não ser com muito maior fonte de energia (sugiro olhar para a Via Láctea de noite, já teremos uma resposta negativa pelas distâncias) e teremos de já planejar uma rota de fuga. Pois mais cedo ou mais tarde, antes do Sol fundir a crosta terrestre inteira, como hoje achamos que no Hawai ou na Islândia seja grande problema um riozinho de lava, tornará a temperatura da Terra inadequada à vida.

Mas aqui um problema. Mesmo com os meus mais otimistas cálculos, prevendo uma capacidade de percorrermos distâncias de 100 anos luz lá pelo ano 6400, chegando antes a visitar a mais próxima estrela pelo ano 5700, colocando distâncias que a tecnologia e a economia permitiram no passado percorrer pelos fenícios milhar de quilômetros, atravessar oceanos pelos navegadores europeus e chineses, chegar a Lua em 1969 e talvez chegar a Marte em 2030. Já calculei outras vezes esta primeira visita interestelar, de 4 anos-luz, pelo ano 20 mil, o dobro da data para o império galático que Frank Herbert escolheu para Duna. Mesmo sendo ajustamento de curvas uma arte incapaz de apresentar confiabilidade além do duvidoso, os números são tão distantes quanto os que separam os arquitetos dos primeiros templos do Egito de nós, como se eles tivessem que conjuntamente com estes projetar a represa de Assuã, inaugurada nos anos 1970.


Um dos meus gráficos mais otimistas de ajustamento de distância em relação ao tempo, mostrando que antes de uns ainda 3500 anos de civilização (mais que o que nos separa dos navegadores fenícios e seus barcos), não alcançaremos estrela próxima alguma.

Nisto, que são questões de engenharia, que é o campo do exercer até de alguma ciência, um tanto de grosseira arte, às vezes com os piores custos e as mais terríveis consequências, chega nossa loucura a acharmos que poderá burlar-se ou  mesmo controlar-se a natureza como recentemente vi em documentário do The History Channel, "Apocalipse Cósmico" (da série, "O Universo"), como se tivessemos condições certas de escapar da extinção das estrelas, da Grande Ruptura (Big Rip), da "morte térmica" ou qualquer outro evento futuro, num futuro que inclui a eternidade, que há anos aprendi que pode ser definido pela seguinte pequena metáfora, que aqui procuro melhorar: Eternidade é o tempo que um gigantesco sino de bronze leva para ser gasto por uma andorinha que a cada milênio passa suavemente em voo a ponta da pena de uma de suas asas, tocando-o por um instante.



Temos um delírio permanente que podemos controlar e escapar de todos os processos naturais, uma coletivização similar, mesmo entre os mais capazes de nós, de que nossa razão e engenho tudo podem, tão doentia muitas vezes quanto a religiosa noção que nossa alma é com certeza imortal ou que, paradoxalmente, "o mundo acabará", e nossos atos serão julgados. Aqui, Freud, em "O Futuro de Uma Ilusão", talvez tenha apresentado os mecanismos mais profundos e certos deste sentimento que nos move por uma segurança insana somada a uma esperança renitente. E como sempre digo, e fundo com o que estudei de Filosofia, em especial Filosofia da Ciência, a esperança é um mal que se traveste de virtude, pois nos nega o aceitar da tragédia, e nos leva, muitas vezes, a nos acomodarmos na espera de uma salvadora providência divina no último instante de uma temerária procrastinação.

Coloco acima também Filosofia da Ciência, pois até nossa visão científica de mundo mostra este raciocínio patologicamente errôneo, que mesmo não podendo dominar fisicamente a natureza (nossas obras e máquinas), a possamos modelar fisicamente (os modelos físicos). Ou seja, nosso intelecto é capaz de por modelos científicos, prever o comportamento da natureza do ínfimo ao infinito. Na verdade, não podemos modelar a pleno nem o comportamento das partículas de canela que vejo boiando em meu café, quanto mais as galáxias, muito menos o "tudo-que-existe", ainda mais que nem sabemos o que este "tudo" seja.

Quanto muito, temos alguns modelos hidrodinâmicos e relativísticos do universo, e mesmo assim, com um entremeio de imensas dúvidas nas inúmeras lacunas, e melhor seria dizer rachaduras. Mesmo nossos mais sólidos e confiáveis modelos, os mais testados, não podem ser fundidos ainda, e talvez nunca o sejam, com outros. O próprio recente livro de Marcelo Gleiser, Criação imperfeita — Cosmo, vida e o código oculto da natureza, aborda esta visão racional de que ciência é apenas uma criação limitada e imperfeita como humana, e do humano tratando de uma natureza que não necessariamente é perfeita e divina, e embora como defendo (e estou trabalhando numa massa quase intratável de informações para sustentar este ponto) talvez produza banalmente bactérias, não necessariamente as mantém até chegar a ser algo como macacos que lapidam pedras, quanto mais que possam escapar de seus vulcões, sistemas solares caóticos e colisivos, e muito menos de suas agonizantes estrelas, em seus últimos surtos de fúria.



Mesmo sem considerar as extinções em massa, sem nem ao menos escaparmos em milhares de mortos de tsunamis médios, infinitamente antes de escapar de universos em congelamento, e focando-se apenas em que invernos vulcânicos causaram destacados gargalos populacionais, então, da mesma maneira que estreitada a população evidenciou-se mais ainda a nossa Eva Mitocondrial e nosso Adão Y-Cromossomial, não façamos que um comportamento de não se entender que já a geologia terrestre pouco se interessa para a presença humana nos comportando como outro personagem mítico, no caso, similar à uma Alice de Lewis Carroll, em seu mundo de fantasias perigosas, mas finalmente inofensivas. O universo, sob toda a ótica, não mostra um autor que permanentemente nos salve de perigos.

Ad impossibilia nemo tenetur, 'ninguém é obrigado a fazer o impossível', já ensinava o direito romano. Na verdade, ninguém é ao menos capaz de fazer o impossível.

Como sou um ambíguo desonesto intelectual, como já citei, aproveito o gancho do filme de Tim Burton e abordo outro terror que nos assombra, e a razão pela qual talvez só assista este filme em vídeo, e em doses homeopáticas, mesmo com a atração da tecnologia 3D.

Antes de continuarmos para abismos mais profundos e íntimos de nossa convivência, deixemos bem claro que embora um embasado realista, sou também um otimista sobre o futuro humano quase ao nível do patológico.



Macaquinhos esquizofrênicos cercando inocentes Alices
(as vezes tão maus como os assistentes da bruxa de o Mágico de Oz, e como mostra Matrix, cada Dorothy do mundo tem de descobrir que não está mais no agradável Kansas)

Há tempos venho dizendo nas conversas de bar que passei a considerar o humano um ser naturalmente esquizofrênico.

Não que tenha duas humanas personalidades, mas apresenta dois comportamentos animais distintos e até antagônicos. Um, aquele da parte superior e frontal do cérebro, capaz de produzir obras como pinturas em tetos de Igrejas, estátuas inigualáveis nas mais duras e intrabalháveis rochas, sinfonias e óperas magníficas e trabalhos científicos sobre as quais erguemos as mais poderosas empreendimentos e até nações.

Estas mesmas pinturas podem estar sobre as cabeças dos mais perversos pedófilos, as estátuas podem ser homenagens aos mais sanguinários tiranos, aqueles mesmo que enquanto podem ouvir a mais magnífica música terem subordinados matando pessoas em escala industrial e com sofisticada ciência, removendo cidades inteiras do mapa. Aqui, caso a caso, não tratemos de questões específicas, até de fatos históricos e política, ou as razões que levaram a quais abusos sobre a liberdade do alheio, atos brutais, assassinatos, ou mesmo genocídios.

A questão é que somos um animal, especialmente em na parte mais traseira e baixa de nossos cérebros, um tanto perigoso, até mesmo para nossa própria espécie.

Um mesmo motivador que leva um autor como James Matthew Barrie a produzir uma obra infantil como Peter Pan, para agradar filhos de uma mulher pela qual era atraído, como bem mostrado no filme Em busca da Terra do Nunca (Finding Neverland, 2004, curiosamente com o mesmo agora como louco chapeleiro Johnny Depp), e até por isso pagar com um certo nível vitoriano de acusações de pedofilia; pode levar a um pedófilo como Charles Lutwidge Dodgson, mais conhecido como "Lewis Carroll", a construir delirantes e surrealistas histórias infantis visando prolongar sua convivência com meninas pelas quais estava atraído.

Mesmo tendo mandado destruir as fotos (sabe-se lá em que número e de quantas meninas, ainda mais com a miserável população dos bairros da Londres vitoriana), as fotos de Evelyn Hatch, totalmente nua, como "La maja desnuda", de Goya, sobreviveram, e sua maneira de retratar já a Alice Liddell, musa das aventuras da literária Alice, já mostram, suas reais intenções.



Alice Liddell, fotografada por Lewis Carroll, e Jane Russell, estrela de Howard Hughes. A similaridade maior está na erotização um tanto rústica da figura feminina, não na pose, roupa e cenário.


O mesmo comportamento um tanto arrependido e buscando a redenção se expressa nas "Confissões", que leva ao filosofar de Agostinho, com insights de cosmologia como "o tempo surge junto com a criação", leva ao tolher-se a sexualidade à já epidêmica homossexualidade e pedofilia na Igreja Católica. Um adendo: os brâhmanes possuem um conceito que nunca lembro o termo e não gastarei tempo pesquisando de que a compulsão pela sexualidade só pode ser detida salutarmente por um período de 28 dias, um 'motor de desejo', que coincide, darwinianamente, com o ciclo reprodutivo do feminino. Noutras palavras, a cada 28 dias, no máximo, necessitamos de algum e qualquer sexo.

Obs.: Confio tanto nos brâhmanes neste ponto, com sua religião no passado tratando do sexual, quanto confio em chás de índios brasileiros, que por milênios selecionaram princípios ativos de vegetais, que de tão eficientes, como qualquer fármaco moderno da mais sofisticada farmacologia e medicina, em doses elevadas passam pela cura e levam até a morte.



Evelyn Hatch e "La maja desnuda" de Goya. Enquanto uma imagem só poderia escandalizar a sociedade de sua época, a outra pode causar repulsa em todas as sociedades desde a Idade Moderna.


Somos uma macaco que embestou de ser um deus, mas ainda sim, guardamos nos porões de nossa mente os mesmos mecanismos que levavam, quando não durávamos mais de 20 anos, à primeira ovulação de uma fêmea, a procurar nossa reprodução. Hoje, apenas duramos umas 3 ou 4 vezes mais, e nossas fêmeas não aceitam, assim como não aceitamos para nossos filhos, que sejam engravidadas pelos 1/6 a 1/8 de suas vidas.

Mas a mesma repulsa que me leva a não ter atração nenhuma pela obra de Lewis Carroll, em qualquer versão, é um dos mecanismos cerebrais que no seu inverso - a personalidade do humano espelhada e monstruosa, o Mr. Hyde do Dr. Jekyll de Robert Louis Stevenson, outro vitoriano - leva a grupos de skin heads surrarem até a morte um rapaz afeminado em praças de São Paulo, quando no passado primata (e nunca foi propriamente só o nosso passado) num morfologicamente idêntico cérebro nos permitia nem mesmo a esboçar qualquer preocupaçã quem ou qual era o sexo com o qual algum de nossos companheiros de grupo tribal estava copulando. Da mesma maneira que a moralidade sexual da civilização, em todas as suas formas foi um mecanismo, e um mecanismo Freudiano, contruído pelo topo/frente de nosso cérebro, os mecanismos de perversidade e brutalidade com o socialmente hoje inaceitável, até o relativamente moral ou costume, são fruto de nossas inferiores/traseiras regiões cerebrais.



Um beijo nada paternal de Lewis Carroll e Alice em contraste com um dos beijos mais famosos do cinema, entre Burt Lancaster e Deborah Kerr em From Here to Eternity.


Alice, ao mesmo tempo que é símbolo da retratação do sonho, do surreal, da literatura criativamente livre e desregrada, a enfrentar monstros inofensivos e distrair crianças horas a fio, é um exemplo de nossos mais primitivos, incivilizados e animais mecanismos cerebrais, "monstros do IDI" que arrastamos pela nossa história, em nossa marcha desesperada por nos mantermos vivos, mesmo em um planeta que não necessariamente nos sirva de abrigo (e que é prisão da qual ainda não podemos sair).

O mesmo humano cérebro capaz de produzir cartapácios morais infanto-juvenis como O Senhor dos Anéis ou As Crônicas de Nárnia - no qual crianças são colocadas em batalhas ao lado de mitológicos monstros que lhes devotam lealdade até a morte - foi capaz de por estratagemas maquiavélicos, obter a atenção de crianças por contos infantis, da mesma maneira que pelas nossas cidades, são atraídas por doces ou até dinheiro para comida, com os piores objetivos.

Alices se aventuram, pois, não entre maravilhas e espelhos, mas entre perigosos vulcões, sob as mais espessas e escuras nuvens de poeira carregadas pelos mais tóxicos gases, tendo de cruzar no futuro os mais tórridos rios de lava, talvez acompanhadas dos pastores mais malévolos, os parentes mais indesejáveis e vizinhos e desconhecidos os mais doentios.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Das moléculas aos buracos negros

Uma revista à escala da massa e ao processo de agregação dos corpos celestes

Lembremo-nos primeiramente de um conceito simples: massa atrai massa.

Gravidade é um força tendencialmente agregativa, e aqui, Aristóteles, mesmo ao errar raciocinando que o local do pesado é em baixo, e o mais pesado, portanto, chegaria ao solo mais rápido, acertou quando percebemos que aquilo que é mais pesado, tendencialmente, atrairá mais e mais massa.

Partamos de uma simples molécula solta no espaço. Esta atrairá outras moléculas, mas não possuirá força gravitacional o suficiente para atrair moléculas constante e crescentemente para sua companhia. Ocasionalmente, formará um "bailado" com outra molécula, e pela própria questão das energias cinéticas envolvidas, superiores às forças eletromagnéticas (e muito superiores às gravitacionais) continuarão no espaço a se comportar como um gás.

Já com determinadas moléculas, a agregação pela força eletromagnética superará a capacidade de os movimentos no espaço persistirem, e cristais se formarão. Um exemplo típico deste tipo de estrutura são os cristais de gelo formadores dos anéis de Saturno.




Grãos de poeira

Propriamente, cristais multimoleculares podem ser até classificados como uma partícula coloidal. Mas pensemos que uma partícula coloidal pode se agrupar com outra, exatamente pelo mesmo motivo que duas moléculas iniciais se agregaram, rumando à uma agregação que podemos chamar de "grão de poeira" (incluindo aqui um "cristal de gelo", seja de água ou outro volátil). Em termos de espaço, as temperaturas envolvidas médias tendem a um valor baixo, de onde podemos afirmar que tudo que não seja propriamente um gás, com moléculas, íons e até átomos isolados agrupar-se-á em estado sólido, formando o que podemos chamar de poeira.

De grão de poeira em grão de poeira, ainda pelos mecanismos eletromagnéticos, a agregação chegará a pesados blocos de gelo, pesadas rochas (o termo 'rocha', sinceramente, em astrofísica não me parece perfeito, mas fica) e constituirão o que chamou-se planetesimais no passado do sistema solar, pequenos blocos de gelo nos anéis dos planetas, pequenas massas de gelo nos cinturões e nuvens (como os que devem haver em abundância no cinturão de Kuiper ou na nuvem de Oort), como o de massas como as que quando caem na Terra chamamos de meteoritos.

Aqui, ainda, o eletromagnetismo será a força/mecanismo dominante, e manterá a agregação crescente. A verdadeira caoticidade e instabilidade, até podemos dizer turbulência dos sistemas astrofísicos, como do sistema solar, mesmo em seus primórdios, quando nem era "solar", pois o Sol não existia, levará à colisões destas pequenas massas, e a força dominante manterá o crescimento dos corpos (assim, como também, por instabilidade em impactos, muitas vezes, sua desagregação).

Mas chegará o momento que a gravidade não será mais insignificante nestas agregações, e se tornará aliada dos mecanismos cristalizantes da força eletromagnética, e acelerará o processo e o tornará mais estável.

Comportamento de agregação e desagregação de moléculas de água sobre uma superfície.



Grandes massas de rocha e gelo

Quando chega-se mesmo ao tamanho dos pequenos asteróides ou de pequenos satélites, como Fobos e Deimos, de Marte, ou das massas dos corpos que quando "desabam" em direção ao Sol chamamos cometas, mesmo com diâmetros de algumas centenas de metros ou mesmo poucos quilômetros, a força gravitacional atinge valores que causam a queda de corpos próximos, mesmo poeiras (sem falar em corpos maiores, que invariavelmente, colaboram com a mútua atração). Lembremos que a gravidade atua a longas distâncias. A partir deste ponto, a ação da gravidade torna o uso do termo acreção mais adequado

Assim, um corpo que passe mesmo a quilômetros de um corpo como Deimos, com 46 km de diâmetro, sofrerá uma atração correspondente a 0,3 milésimos da atração da gravidade terrestre, mas ainda sim, não nula. Por menor que seja esta atração, atuará, e mais cedo ou mais tarde, formará um corpo de muito maior massa, poeira após poeira, até molécula após molécula capturada do espaço, mesmo com um contrabalanço de voláteis que escapem novamente para o espaço, mantendo, percebamos, uma determinada concentração de gás, uma determinada pressão, logo, conservando uma determinada massa atrativa, para posteriores acreções.


Asteróides, Cometas, Planetas Anões


Chegando a massas de determinados valores, o corpo celeste será classificado por sua composição e órbita como um asteroide, que poderá ser desde um fragmento bastante denso originalmente de uma camada de uma estrela anterior que explodiu, composta por exemplo de denso ferro (infelizmente, aqui, julgo que é impossível tratar o tema sem pular passos que pretendia tratar em ordem) de massas correspondentes a blocos de ferro de 50 metros de diâmetro, como a que caiu no Arizona, até massas de agregados como Ceres, com pouco menos de 1000 km de diâmetro e densidade aproximadamente o dobro da densidade da água líquida na Terra.

Corpos de outra composição, mais distantes do Sol, também serão mais agregados, mesmo imensos, de diversos voláteis (definição que observemos, depende de temperatura) e apresentarão densidades em torno desta, mesmo para corpos de quase 3000 km de diâmetro, como Tritão, o satélite de Netuno.

Corpos de menor tamanho, ainda que de densidade relativamente mais alta, poderão não ter pressão pelas suas massas, em direção ao seu centro, para serem mais que aglomerados "macios" de rochas e gelo, como 433 Eros (ou mesmo os satélites de Marte), com medidas de dezenas de quilômetros, para tenderem a ser esféricos, e formarem massas pouco permeáveis, adensadas. São como bolos de terra enormes, similares aos solos na Terra, onde a água e o ar são substituídos por vácuo e talvez alguns rarefeitíssimos gases.

433 Eros e o Monte Everest, aproximadamente na mesma escala.


Apenas como comparativo, a densidade de um material, mesmo no vácuo e no espaço, como o vulgar na Terra granito ou basalto, gira em torno de 2,7 a 2,9. Logo, mesmo compostos de alto teor de ferro e outros materiais mais densos (só o ferro responde por densidade de 7,8 ) não colaboram para que tais corpos, com sua baixa compactação, possuam alta densidade.

Os maiores cometas, quando se aproximam do Sol, perdem seus voláteis em grande taxa, exatamente porque sua massa não permite que os retenham, mas podem, perfeitamente, distantes da ação do Sol, acrecerem massa.

Os maiores corpos de grande acreção em voláteis são os agora classificados como planetas anões distantes, como Plutão (diâmetro de 2300 km, densidade de pouco mais de 2), Haumea (D=1600 km, d=2,6 a 3,3), Makemake (diâmetro de aprox. 1600 km e dens. de aprox. 2), sobre Éris pouco se sabe, mas coisa alguma nos leva a crer que possa ser diferenciado dos demais corpos de mesma natureza. Plutão chega, similarmente aos cometas, a produzir uma tênue e fina atmosfera, quando se aproxima do Sol (no que brinco que faz parte de suas características que me fazem definí-lo como um "cometão"), a diferença com os cometas é que volta a condensar esta atmosfera, pois sua massa assim permite.

Planetas rochosos

Chegando a determinada massa, os corpos passarão a ter determinada massa e esta conduzirá, dada determinada composição da região onde se agregou, a apresentar determinada densidade.
Primeiramente, se agregando numa região de alta taxa de voláteis, um satélite gigante como Ganimedes apresentará, com diâmetro de mais 5200 km, densidade de 1,9 , mesmo com o planeta ao redor do qual orbita, Júpiter, tendo uma densidade de 1,3.
A partir deste ponto, há uma continuidade de massa, diâmetro e uma determinada faixa de densidade que vão desde Mercúrio (com pouco menos de 4900 km e densidade relativamente alta de 5,4), passando por Marte (pouco menos de 6800 km e d=3,9), Terra e Vênus, os irmãos do sistema solar, com seus 12 mil km de diâmetro e densidade de 5,2 a 5,5. Mesmo somando o sistema binário que é a Terra e a Lua, os sistemas de acreção que são Vênus e Terra são separados por uma diferença percentual de massa que não passa de 23%.

Acima disto, no sistema solar não há acreções desta faixa de densidade para maiores massas, mas entre os planetas extrasolares existem as chamadas adequadamente "super-terras", que são planetas de massa significativamente maiores que a Terra, como HD 69830 b , com diâmetro estimado de 14 mil km e dens. acima de 7 (muitos metais, certamente) e massa de 10 vezes a da Terra, um "super-Mercúrio" (a expressão é minha); como COROT-7b de mais 1,7 vezes o diâmetro da Terra e aprox. 4,8 vezes sua massa, embora densidade próxima (de 4,3 a 6,9); ou ainda corpos que acreceram certamente grande massa de água, colossais oceanos de profundidade de milhar ou mais de quilômetros, como GJ 1214 b (se sabe isto exatamente pela sua densidade, na faixa de 2).

Corot (em concepção artística) e a Terra, em comparação.

As combinações nesta escala de acreção são infinitas e pode existir uma continuidade completa de tamanhos e densidades variadas até os gigantes gasosos que há séculos conhecemos em nosso sistema solar.


Planetas gasosos

Entre os exoplanetas, existem corpos que são "pequenos gigantes gasosos", como provavelmente é Gliese 777 c , com densidade de 18 massas terrestres, e pela sua posição, é tratado como um "Netuno quente".

Assim, nos planetas, podem existir grandes massas gasosas, aproximadamente esféricas, com massas que vão de um tanto acima de dezena da massa da Terra, passando por nossos (e outros corpos como os nossos) Urano, Netuno, Saturno e Júpiter, em graduação, que são resultado de uma posição na qual existia uma massa de gases o suficiente para formar tais esferas, assim como também uma distância segura para suas atmosferas não serem "varridas", sopradas, em balanço com gravidades e campos magnéticos que estas atmosferas retenha e proteja.

Mais próximos, seriam soprados pelos ventos estelares (a generalização do que para o Sol é o vento solar) até restarem núcleos tais como as "Terras" e "super-Terras", mais leves, nem teriam acrecido tanta massa, e sem gases, nem teriam massa para acrecer. O balanço de tais fenômenos se mostra complexo, e muito mais um processo de múltiplas variáveis que as esferas exatas relacionadas com os sólidos geométricos perfeitos, do delírio imaturo dos primeiros pensares da cosmologia de Kepler.
Não tarderemos em descobrir "Terras", planetas rochosos, tão massivos quanto "Júpiteres", ou planetas com oceanos e crostas de gelo como "Netunos aquosos", ou mesmo planetas como Vênus, mas de grossas atmosferas como Titã, compostos de hidrocarbonetos e amônia, ou mesmo satélites que ao modo de Ganimedes, que é maior que Mercúrio, sejam até maiores que a Terra (ou seja, a ficcional Pandora, de Avatar, ainda que noutra estrela, pode ser possível).

TrES-4 (representação artística), até determinada data, o maior exoplaneta conhecido, em comparação ao nosso gigante.



Anãs marrons

Digamos que a acreção que produziu os gigantes gasosos como júpiter e até planetas já conhecidos maiores, como TrES-4 e WASP-17b , com massas consideradas próximas as de Júpiter. Mas a acreção de gases poderia continuar, chegando a determinados valores que fariam não poder ser classificado como um planeta, mas como uma "estrela fracassada", aquela que não produz reações de fusão nuclear, nem mesmo a mais "fácil", que exige menor pressão, como a da cadeia próton-próton, embora possam ter no passado realizado ou de uma maneira difusa a fusão de deutério e lítio. Possuem uma massa superior a 13, mas inferior a 75 vezes a massa de Júpiter.
Muito provavelmente, descobriremos sistemas em que em semelhança à Júpiter no nosso sistema solar, exista um anã marrom, fazendo seu papel.

A Terra, Júpiter, uma anã marrom típica, uma estrela anã vermelha e nosso Sol, em comparação.


Estrelas

É claro que a acreção pode se manter, e chegará ao ponto em que a massa será o suficiente para gerar pressão tal que propicie a fusão em cadeia próton-próton, e a esses corpos, já pela relacionada à temperatura, chamamos de anãs vermelhas.

Uma estrela, ainda que possua uma medida da ordem de milhão de quilômetros de diâmetro, apresenta densidade média, com a do Sol, de 1,4 toneladas por metro cúbico, pouco maior que a da água, e igual a de alguns solventes ou determinados plásticos. Já seus núcleos, da mesma maneira que a Terra, com muito menor tamanho e massa 330 mil vezes menor, apresentando pressões da ordem de milhões de atmosferas em seu centro, apresentam pressões tais que a densidade dos prótons, elétrons e núcleos de hélio ali presentes apresentem, mesmo a temperaturas de 15 milhões de graus, densidades de 150 kg por litro, muito mais que o mais denso material na Terra, que é o metal ósmio (22,6) e mais que o mesmo extremamente pressionado ferro do núcleo terrestre (11 kg/L). Estrelas ainda mais massivas apresentarão núcleos ainda mais densos, e exatamente por isso, capazes de produzir reações de fusão de núcleos ainda maiores que os do hélio.

A estrutura típica "em cebola" das combustões de núcleos atômicos em ordem crescente de uma estrela de grande massa.

Assim, de massa em massa crescente, as estrelas na chamada sequência principal distribuir-se-ão por massas crescentes entre 0,075 massas solares e o limite de Eddington , em torno de 150 massas solares, quando então a estrela, mesmo com toda a ação da gravidade, expulsa parte de sua massa de tanta energia que produz. Assim as estrelas tem um limite mínimo e um limite máximo de existência, no qual envelhecerão produzindo energia.

Neste envelhecimento, que é tanto mais rápido quanto maior for sua massa, alterarão sua composição, crescentemente pelos núcleos da tabela periódica, número atômico após número atômico, crescentemente em direção ao seu centro, até que comecem a produzir ferro, e invariávelmente expelirão violentamente suas camadas externas (quando tal fenômeno produz elementos mais pesados, na onda de choque), e se comportarão como novas, das mais variadas intensidades, mas deixando um núcleo, um "caroço", restante "sobrevivente" à explosão.

Se não tiverem massa o suficiente para produzir ferro, realização fusão até o momento em que produzirão o mais pesado núcleo que sua pressão permite, e então, queimando mais e mais camadas externas a um pesado núcleo, ou já, como no caso do Sol, iniciando a produção de hélio, incharam (exatamente porque a energia produzida vence a gravidade) em gigantes vermelhas até que esgotem estes elementos a serem produzidos, e então, a força gravitacional vencerá a energia (num caminho aproximadamente inverso do limite de Eddington) e condensarão até formarem um núcleo altamente denso.

Este núcleo poderá ser uma massa suficientemente densa, mas cuja pressão pela gravidade seja resistida pelos elétrons, abundantes e em contrapartida aos primordiais prótons, pois a carga dos corpos celestes é tendendialmente nula na totalidade, ou mesmo esta força não resistirá a pressão, e a compactação persistirá.

Comparação de tamanhos de estrelas, embora inadequada para comparar a "sequência principal". Os mecanismos que geram o tamanho das gigantes vermelhas é diferente do tamanho gerado pela massa quando na sequência principal. Nesta escala, como destacado, o Sol é um pixel (ponto) da imagem.


Anãs brancas

Para estrelas de massa de até 10 vezes a do Sol, após a perda das camadas mais externas, a massa restante, um ""caroço", um corpo celeste constituído de apenas prótons e nêutrons, resistindo por repulsão em uma forma de oposição a continuar se compactando chamada pressão de degenerescência eletrônica, contendo a massa de 0,6 massas solares num volume aproximado da Terra. Para ter-se outra visão destes valores, uma massa de 198 mil vezes a massa da Terra no mesmo volume, com uma densidade, para estes números, de 1 tonelada/cm³, que corresponde a imagem de um pequeno besouro com a joaninha, que seriam os núcleos dos átomos, às órbitas eletrônicas, que são os elétrons, que em pressões normais correspondem a um estádio de futebol, a estarem agora comprimidos a uma banheira jacuzzi de 2 m de diâmetro.



Não pensemos que acreção ainda não possa ocorrer, pois este caroço, apenas uma "sólido" de uma mistura de núcleos e elétrons continua evidentemente com massa e capaz de atrair massa(exatamente como o faria uma estrela um tanto menor que o Sol). Esta acreção produz, até pela compressão que pode causar na, digamos, superfície da anã branca, violentas reações de fusão, e tal produz o que chama-se uma supernova do tipo Ia. Uma estrela próxima que doe massa para este tipo de fenômeno produzirá uma cadência deste processo, que torna-se constante e estável no tempo, permitindo o que se chama de uma "vela padrão" em astronomia, propiciando medições de distância e através desta, até a velocidade de deslocamento de galáxias em relação a nós.

A massa limite para a pressão causada pela massa ser resistida pelos elétrons e seu comportamento é de aproximadamente 1,4 massas solares, e tal se chama limite de Chandrasekhar.

Representação artística de uma anã branca absorvendo matéria de uma estrela próxima e explodindo em supernova (Astronomy Picture of the Day - zuserver2.star.ucl.ac.uk).



Estrelas de nêutrons

Em caso de a massa resultante ou agregada se tornar superior ao limite de Chandrasekhar, a oposição dos elétrons não mais resistirá a gravidade e os elétrons e os prótons anularão suas cargas e formarão um corpo celeste predominantemente formado de nêutrons, cuja densidade que é a do ordem do núcleos dos átomos, da ordem de em torno de 1 seguido de 15 zeros de gramas por cm³, ou de 1 seguido de 14 a 15 zeros toneladas por metro cúbico, ou ainda, para se ter idéia desta densidade, da massa de algo como 10 morros do Pão de Açúcar num dedal.
Por outras vias, estes corpos apresentam massa da ordem de 1,5 vezes a massa do Sol numa esfera que tem em torno de duas dezenas de quilômetros, pouco mais que os menores asteróides que observamos no nosso sistema solar, ou os menores satélites conhecidos de seus planetas,
Estes corpos são tão atrativos gravitacionalmente que estima-se que em sua superfície, existam oceanos de ferro, níquel e cobalto, e com continentes destes e outros metais, similarmente a crostra terrestre, mas imensamente comprimidos, ainda mais que o núcleo da Terra, mas com apenas alguns milímetros de espessura/altitude/profundidade. Abaixo, haveriam camadas de matéria degenerada como as anãs brancas, depois um "manto" de nêutrons, e a medida que a massa aumente, mais e mais nêutrons no centro fundem os quarks que os compõe e formam o que se chama híperons, partículas com mais quarks que os habituais 3 dos prótons e nêutrons.

Este crescimento de híperons, tanto em número com o avançar da pressão, quanto no seu próprio tamanho, agrupamento de quarks a agrupamentos de quarks, poderia levar a formação de corpos que ainda não são mais que hipóteses em busca de corroboração, e os próprios mecanismos da estruturação de camadas internas das estrelas de nêutrons não é perfeitamente entendido. Nem seus comportamentos de formação de poderosos campos magnéticos são plenamente entendidos, existindo corpos já identificados que se comportam com intensos campos magnéticos, os chamados magnetares.

Devemos alertar, mais uma vez, que estrelas de nêutros podem acrecer massas de estrelas próximas (assim como qualquer corpo), incluindo aí anãs brancas, e mesmo outras estrelas de nêutrons.


Imagem astronômica de uma estrela de nêutrons e sua região circundante (ESA), esquemas de seus feixes de radiação e campos magnéticos (lifeng.lamost.org), de sua estrutura (daviddarling.info) e uma representação artística, próxima a uma estrela (newcientist).



Estrelas de quarks

Imaginemos uma estrela de nêutrons tão massiva, que a resistência dos nêutrons, logo a identidade de seus quarks reunidos em trios, em neutros diferenciados, não seja mais suficiente para resistir a pressão, e o corpo celeste se transformaria numa enorme partícula subatômica, uma matéria completamente constituída de quarks.

Da mesma maneira que as anãs brancas possuem o limite de Chandrasekhar, as estrelas de nêutrons possuem o limite de Tolman-Oppenheimer-Volkoff, que seria, em termos simples, o limite que os nêutrons resistiriam a pressão. Estes valores de massa restante nos núcleos de estrelas/corpos celestes se situa acima de uma faixa de 1,5 a 3 massas solares.

Comparação, incluindo do tamanho, entre estrela de nêutrons típica e o que seria uma estrela de quarks (chandra.harvard.edu).


A partir deste ponto, e destas densidades, a situação torna-se um tanto nebulosa (com o perdão do astronômico trocadilho).


Buracos negros estelares

Até as massas anteriores, e a correspondente densidade causada pela gravidade, as compactações eram inteligíveis por questões de mecânica quântica, e nem tratamos de apresentar distorções causadas na luz (e na imagem que se teria) por tais corpos celestes. A partir desta massa, ao atingir-se um raio na compactação igual ao chamado raio de Schwarzschild, que corresponde para uma estrela da massa do Sol de aproximadamente 3 km (lembremo-nos que algo 6 vezes menor e 200 vezes mais compacto que uma estrela de nêutrons de mesma massa) a velocidade de fuga de tal massa se tornaria teoricamente tão alta que seria maior que a velocidade da luz, e mais nenhum corpo nem mesmo a própria luz escaparia ao campo gravitacional do corpo celeste. Seriam corpos puramente atrativos, crescendo permanentemente enquanto forem alimentados, jamais cedendo massa (pelo menos dentro de uma primeira análise, vide radiação Hawking).


Uma das muitas representações artísticas de um buraconegro absorvendo massa de uma estrela próxima (dsc.discovery.com).


Antes de avançarmos por mais massas, façamos algumas colocações sobre teorizações alternativas aos buracos negros relativísticos, assim os chamemos, pois são tratados completamente dentro da teoria da relatividade para serem concebidos e terem seu comportamento modelado.

Buracos negros, são, dentro da relatividade, tratados como uma deformação extrema, na verdade, teoricamente infinita da textura do espaço-tempo. Lembremos que a deformação não é causada pela massa somente, pois se apenas a massa causasse uma deformação teoricamente infinita, as galáxias, que contém até muitos buracos negros, causariam uma deformação infinita, e basta olharmos para outras galáxias (mesmo a olho nu) para percebermos que tal não ocorre. O que causa a deformação infinita é a massa extrema num determinado volume mínimo, ou seja, densidade.

Na relatividade, além de uma superfície que não mais emite luz, como vimos acima, chamada horizonte dos eventos, não existe o que seja "matéria" ou um "corpo", e sim, toda a matéria se desfaz e concentra-se num ponto (uma singularidade). Além deste tipo de coisa, nada pode-se afirmar. Mas existem teorizações, que para fugir destas situações (ou apresentar alternativas) propõe outros tipos de corpos, que resultam em efeitos exatamente iguais a partir do horizonte de eventos aos buracos negros 'relativísticos', mas possuem uma estrutura, uma composição, e até podemos dizer, uma 'natureza imaginável'.

As estrelas negras não são propriamente uma alternativa a um buraco negro, mas uma etapa intermediária teórica entre uma corpo extremamente supermassivo e a singularidade. Ao tender a massa para o colapso gravitacional típico dos buracos negros, este colapso seria detido por efeitos quânticos, podendo deter a ainda maior compactação da matéria, gerando um corpo que é um estado transitório entre o que seja o objeto que para a relatividade é um buraco negro e uma estrela de nêutrons tremendamente compacta.


Estrela negra e sua estrutura (universe-review.ca, originalmente de Scientific American).


Um gravastar seria um corpo, que ao chegar a determinada compactação, principia a possuir determinados fenômenos quânticos que impedem a ainda maior densidade.
Desconheço sobre teorizações sobre bósons de Higgs e suas relações com teóricos corpos de extrema densidade.
Por aqui encerra-se o aumento de densidade como um limite, até porque chegamos a uma máxima compactação, mas não necessita-se, de forma alguma, limitar a massa acrecida.



Gravastar, comportamento e estrutura (andersoninstitute e win.xiulong.it).


Buracos negros supermassivos

Independentemente do que realmente sejam buracos negros, o processo de acreção crescente não muda com os mecanismos íntimos e a constituição de tal corpo completamente acressor final.
Digamos que um buraco negro qualquer encontre-se no centro de uma região de alta densidade de matéria por extenso volume, uma enorme concentração e disponibilidade de gás, de matéria, seja na forma que for, estrelas e seus corpos orbitantes, anãs brancas, estrelas de nêutrons e até mesmo outros buracos negros. O centro denso, o dito 'bojo' de galáxias são assim.
Então um corpo da natureza dos buracos negros, quando neste ambiente, poderia acrecer constantemente massa, até esgotar-se as massas capturáveis que o cercam, de maneira similar ao nosso Sol, que não permite a existência de massa alguma o circulando, a não ser as massas que encontram-se numa posição de equilíbrio, permanentemente escapando de sua atração, como são os planetas, entre outros corpos. Estes corpos podem ter iniciado sua formação quando o universo era mais jovem e mais denso, estando a matéria menos dispersa pelo espaço.

Um detalhe que deve ficar claro é que as galáxias não orbitam ao redor dos buracos negros supermassivos em seus centros como planetas ao redor do sol. As galáxias não são como são porque são nuvens orbitando corpos centrais, os corpos centrais existem porque as gáláxias propiciam sua formação. As galáxias são como nuvens, e seu comportamento de uma acreção é de uma nuvem na qual todas as partículas colaboram para o comportamento do todo, gerando inclusive, um centro de massa comum.
O que podemos dizer é que tais corpos, de maneira a complementar o acima, é que gerariam um "vácuo" de estrelas, exatamente porque as absorveram, em meio a regiões de extrema densidade de estrelas, e restaria uma "casca" de estrelas que estão numa posição digamos 'segura'. As estrelas que realmente orbitam estes corpos podem apresentar velocidade de até 5000 km/s (que é exatamente a velocidade que as impedem de serem sugadas para o buraco negro).

Em termos de massa, enquanto buracos negros oriundos do colapso de estrelas podem ter massas de dezenas de massas solares (até porque, lembremos, não existem estrelas maiores que 150 massas solares, logo, existe um limite máximo para o "caroço residual"), os buracos negros supermassivos são ilimitados em massa, e partem de teóricas 100 mil massas solares a até calculados por observações bilhões de massas solares. Existe, até a possibilidade, e tal tem-se observado, de formarem sistemas duplos, exatamente pela acreção de múltiplas estrelas ter-se dado não em um único ponto, na região de alta densidade de estrelas, e se comportariam aproximadamente, em grande escala para suas galáxias, como sistemas binários de estrelas, com sua nuvem de gás circundante.

Lembrando das estrelas orbitantes a buracos negros, a velocidade de milhares de quilômetros por segundo, observemos que os efeitos de deformação do espaço-tempo, que já são notáveis na comportamento da órbita de Mercúrio, mesmo com um campo relativamente pequeno como o do Sol, seriam muito maiores em campos gravitacionais milhares e até bilhões de vezes maiores.



Relação entre massa dos buracos negros supermassivos e massa do bojo ou bulbo galático, e o estudo de um destes corpos, no centro de uma galáxia (blackholes.stardate.org e NASA).


Finalizando, devemos citar que a acreção continuará, corpo celeste após corpo celeste, estrela após estrela, transformando o universo de uma enorme nuvem relativamente homogênea a um pontuado de corpos celestes densos em resfriamento, porque massa atrai massa e a entropia inexoravelmente aumenta, e somente este processo será contrabalançado, teoricamente, no mais distante tempo, pela expansão da métrica espaço-tempo a velocidade crescente, quando poderia transformar o universo num gás de matéria dissociada infinitamente rarefeita.

Do pó viemos, mas não voltaremos ao pó. Iremos ou ao frio absoluto em massas imensas e compactadas ou ao vácuo, em infinita dispersão.

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Extra

O balanço da força gravitacional (de compressão) e das forças explosivas e pelo calor (expansivas) se dá da seguinte maneira:



Onde: setas azuis correspondem à força gravitacional e setas amarelas correspondem às forças de expansão.

1 - Estrela na etapa de estabilidade entre força gravitacional e 'força explosiva', a sequência principal, propiciada pela fusão nuclear.

2 - Início das reações nucleares que superam as forças gravitacionais, quando a força gravitacional não detém as camadas mais externas da estrela e seu volume cresce, tornando-se uma gigante vermelha.

3 - Fase da matéria degenerada (como as anãs brancas) em que as forças gravitacionais superam qualquer força produzida por fenômenos geradores de calor.

Deve-se observar que as estrelas aqui estão completamente fora de escala, pois uma estrela como o Sol, na etapa que está, na sequência principal, possui diâmetro de 1,4 milhão de quilômetros. Na fase de gigante vermelha, chegará a um diâmetro de quase 300 milhões de quilômetros (aproximadamente 200 vezes maior, maior que a órbita de Vênus) e por fim restará um caroço pouco maior que a Terra (umas 100 vezes menor que o diâmetro atual do Sol).

Para cálculos disto, uma boa pergunta e uma excelente resposta formal no Yahoo! Respostas.

Agradecemos ao Google, que agora dotou o Google Docs de um excelente e prático editor de desenhos.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Inteligência III

Apontamentos e divagações sobre moral

Lembro como hoje de um brutal homicídio na periferia de Porto Alegre, lá por 93 ou 94, no qual um rapaz matou a mãe e a esquertejou, visando tirar-lhe os demônios que julgava que estavam em seu corpo. Lembro dos detalhes de a polícia ter achado a genitália e útero da pobre senhora de baixo de sua cama. Lembro dos arrepios de uma então namorada lendo a notícia no jornal.

Lembranças marcantes pelo emocional são uma poderosa ferramenta de nosso cérebro para guardar memórias. Muito provavelmente, porque são uma ótima maneira de saber, por exemplo, que determinado tipo de morte de parente (no passado, da "tribo") tenham ocorrido por mexer com aquela cobra daquele padrão de cores, cutucar aquele vespeiro, comer aquela planta ou não prestar atenção quando apoiando o grupo a abater aquele grande mamífero, que nos alimentaria por dias.

Mas percebamos, que um crime de tal brutalidade, embora tenha marcado minha memória, assim como o de meus familiares, que lembram-se do caso, certamente de minha ex-namorada, não causou comoção popular, manifestação da mídia ou larga repercussão até em ser considerado como marcante na história da justiça, nem mesmo de eu lembrar se foi em qual cidade próxima de Porto Alegre, se Viamão ou Canoas.





Belo exemplar de arte relacionada a videogames, mostrando o quanto a violência - e até o seu "culto" - está presente na nossa cultura.




A lembrança (em mim e outros) é forte, mas os mecanismos inerentes a sua ocorrência são universais e desprezíveis na história humana. Aquilo que chamamos "loucos" sempre existiram. É natural, até estatisticamente, que a construção do cérebro humano, assim como a construção da mente nele operando sempre apresente erros ou natos defeitos. Assim, sempre haverá o desequilibrado... , perdão, incapaz, que por uma motivação absurda no prático (aquilo que venha a ter algum nexo com objetivo proveitoso) enfie um machado na cabeça da mãe, queime o filho ou coisas brutais similares. Mas são mecanismos no biológico completamente diferentes do leão macho, que ao dominar um novo grupo de fêmeas, trata de matar todos, e até se alimenta de alguns, os filhotes de seu antecessor. O leão via eliminar sua concorrência genética e ampliar a produtividade (pela posterior fertilidade natual das fêmeas) de sua descendência.

É um comportamento completamente diverso dos cães, que por exemplo, determinam que um enorme dinamarquês fique ao lado de um carrinho de bebê e não deixe ninguém, a não ser os "macacos pelados" conhecidos de sua "matilha", se aproximarem. O "machado na cabeça da mãe" é similar ao comportamento daquele cão que alguns já tiveram, ou todos conhecem alguém que já teve, que se avança sem mínimo motivo até em quem está lhe trocando a água desde pequeno, e a partir daí, será incontrolável e intratável, exatamente na mesma medida que o mais capaz de ser violento pit bull ou rottweiler pode comportar-se como um filhote de labrador, rastejando por uma brincadeira ou pedindo quase chorando uma coçada na enorme barriga. Não é a genética mais ampla que determina a brutalidade absurda, o ato insano. Pode ser a genética específica, o detalhe, o desencadeador do ato insano. Pode ser também o processo ao longo de anos, de inúmeras variáveis, que na verdade podem ser o que chamaríamos sem problema de um contexto histórico, que leva ao ato insano.




Mas cães são lobos, todos hoje sabemos (ou devemos saber). Mas sob certo aspecto de amadurecimento, especialmente o sexual/social, os cães genericamente não são lobos estritamente. Assim, o velho e enorme rottweiler de meu vizinho, embora treinado para ser agressivo pois cão de guarda, seguidamente tentará se comportar como um filhote, enquanto o lobo canadense do zoológico mais próximo, na primeira oportunidade, quando o tratador entrar em seu alcance, ainda mais se debilitado por um resfriado, avançará sobre ele na tentativa de dominar a "matilha". Selecionamos entre os lobos, ao longo de dezenas de milhares de anos, aqueles que mantém seu comportamento nos considerando machos alfas por mais tempo.

Contrariamente a leões e lobos, somos uma espécie que pela vantagem que nos traz a acumulação de cultura, ao encontrarmos uma criança no lixo (outro crime brutal/bárbaro) a acolhemos em nossas casas, e até entraremos em processos judiciais para tê-la sob nossa guarda. Da mesma maneira, não cortamos em pedaços os membros mais velhos e fracos de nossas famílias e com eles complementamos nosso almoço de domingo. Lá no fundo, sabemos que crianças podem vir a ser de grande valor em nossos grupos familiares/tribais/sociais, e idosos podem guardar grande experiência, e esta será também proveitosa para nossos grupos.

Tal conjunto de características de vida em sociedade nos levou a inigualável vantagem sobre os leões, sobre os lobos e até sobre animais que ao longo de milhões de anos não tiveram predador significativo, a não ser sobre suas mais frágeis crias, como os elefantes. E lembremos que os cães são ditos como nossos melhores amigos, os leões são em sua morte por caça ritual de passagem para a maturidade de diversas tribos africanas (assim como os tigres na Ásia ao que parecem não possuem vantagem alguma sobre nós) e os menores entre os humanos, os pigmeus, caçam o elefante das florestas do Congo.

Caça ao elefante no igapó Zambizi, sul da África. Fonte: Livingston - Viagens Missionárias

Expandindo para o civilizatório, como disse meu pai certa vez num discurso numa entidade beneficiente, "o que mede as mais sofisticadas sociedades é a maneira como tratam seus mais frágeis membros", o que, por outras palavras, posso traduzir para um contexto mais amplo no tempo com o paradoxo de que na sobrevivência e participação no social de deficientes físicos graves como Stephen Hawking, ou deficientes sensoriais como Helen Keller, são exatamente a base biológica de nosso sucesso. Assim, a preservação de nossos mais frágeis nos levou a domesticar os cães, matar os leões e elefantes (sem considerar as inúmeras espécies que já nos foram vítimas ao competirem conosco).

Nossa preservação dos mais frágeis e mais velhos nos levou ao mesmo estado básico de vanatagem em relação à inúmeras outras espécies que possuem as formigas e as abelhas, e outros insetos sociais. Não somos geniais individualmente, nem muito menos imensamente aptos com força, garras, dentes e carapaças. Mas na união de nossas fraquezas, nos comportamos como uma imensa massa inteligente, muito mais capaz que cada um dos componentes, e maior, na verdade, que a soma das forças e aptidões individuais. Guarde este último argumento, e se não concorda com ele por uma lógica aparentemente no momento sólida, verá que meu argumento é muito mais sólido, e será cristalinamente apresentado.

Voltando aos crimes brutais, percebemos claramente que nossa sociedade considera o crime insano (o esquartejar a mãe por delírio místico) como uma lástima, e seu autor mais digno de pena pois claramente um doente. Já os crimes brutais, covardes, desmedido em relação ao que os motivou, execráveis e repulsivos, e seus autores são perseguidos até no meio dos criminosos.

Todos sabem que os apenados não toleram assassinos de crianças, estrupadores e assassinos de familiares sem uma "muito boa justificativa". Por outro lado, tribalmente, respeitam os assassinos de policiais (os membros da "tribo rival") e garanto, amigo leitor, que se você for sincero, tem alguma admiração pelos grandes ladrões, os gênios do crime não violento, que assiste em inúmeros filmes sobre grandes roubos. Explico: temos ainda uma certa dificuldade em nossos cérebros de lidar com aquilo que seja propriedade. Até, pelo simples fato, diferentemente de diversos primatas, carnívoros e alguns marsupiais, e até dos elefantes, somos animais manipuladores (somados aos "proboscidemanipuladores", se me permitem um irônico neologismo), mas também somos animais apreendedores, apreendemos e passamos a possuir e portar objetos. Tanto que medimos muito de nossa riqueza pelo número de bens em nossas casas, e mesmo o número de casas, e dificilmente, consideraremos um grande escritor ou pintor como ricos pelo número de obras que produziu, e sim, pelo palácio em que chegou a morar com tal produção. Logo, nosso cérebro nos leva a apreender coisas, muitas vezes à cobiçá-las, até a roubá-las e inclusive, achar este roubar algo um tanto relativo.

Pigmeus e seus objetos (http://www.anthropology.ac.uk/)


Por este motivo, a população tende a aceitar o político corrupto, esquecer seus pecados passados e reelegê-lo, mas jamais aceitará morando em sua vizinhança um pedófilo, muitíssimo menos um estuprador e de maneira nenhuma perdoará um assassino de um crime brutal.

Pelos mesmo mecanismos, eu, um engenheiro, como seguidamente discuti com amigos de diversas profissões, se por um motivo ou outro for condenado à prisão, por um crime não brutal e dentro dos padrões repulsivos citado anteriormente, serei entre os presos "o doutor", e se me comportar dentro de determinados padrões de respeito à sua hierarquia, não serei perseguido (não pelos motivos de repulsa), mas o vizinho de um parente deles, se estuprador, terá de ser mantido no que chamam em São Paulo de "seguro", pois sempre estará na beira do abismo de ser executado por simples profilaxia, dentro daquilo que apenados, como vimos por um motivo biológico e nas bases de nossa evolução social, consideram intolerável.

Mas o conhecimento, tanto dos menos favorecidos fisicamente, e até deficientes, quanto dos velhos, sempre nos foi útil, e lembrando e reforçando o que citei acima, uma pessoa com bons conhecimentos sobre produtos químicos, solventes, explosivos pode ser sempre útil, por isso que um engenheiro químico pode ser muito útil a criminosos (e poderíamos adaptar as aptidões a diversas outras formações profissionais) e pela mesma raíz de motivos, nascente lá nos nossos primeiros agrupamentos, os estrupradores, por exemplo, não são. Sou tão útil a um grupo de criminosos quanto foi o hábil velhinho manco confeccionador de boas lanças, mantido sustentado por todos da tribo em sua palhoça. Há muito nossa espécie já descobriu que scientia potentia est.
Pontas de flechas em pedra cuidadosamente feitas e "aquele famoso físico", mostras de um mesmo fenômeno que é possível pela evolução humana.


Somando, na sociedade, nosso comportamento caçador de 200 mil anos evidencia-se em alguns grupos claros: os policiais, os grupos de combate das forças armadas, as quadrilhas de assaltantes de alto nível, como os assaltantes de carros-forte e bancos e os esportistas de esportes coletivos. Estes grupos guardam características de mútuo apoio, lealdade, agressividade focada e uma certa "dicotomia moral" - como digo e adiante explicarei - que nasce nos grupos de "machos punidores" que se estabelecem já nos chimpanzés, e na nossa espécie, se aperfeiçoaram nos grupos de machos caçadores, e das fêmeas agrupadas em coleta, cuidando de seus filhos, onde está muito das bases de nossa vida social, e desta o que chamamos de civilização.

Muito de nossa civilização se deve a corajosos caçadores primatas que aventuraram-se a atravessar mares, oceanos, desertos e montanhas, e posteriormente, a pisar na Lua. Muito das nossas maiores realizações civilizatórias se devem aquilo que entre esportistas diz-se "viciados em adrenalina". O que levou povos originalmente africanos a atravessar mares e colonizar continentes é exatamente o mesmo mecanismo que nos leva a nos fins de semana saltar de paraquedas, a enfrentar ondas gigantes, etc.

Este tipo de comportamente impetuoso, podemos dizer, nos levou de pacatos macacos das planícies africanas à almejar altos vôos, mas também nos relegou um determinado lado sombrio. É exatamente o egoísmo de cobiçar uma bela tela do valor de milhões, e admirar o ladrão dos filmes que a rouba de maneira brilhante, que nos leva a para proteger nosso nome, ou imagem pessoal, a partir de um pequeno erro doméstico, a nos colocar em uma marcha que levará a atirarmos (e tal não mais se deve discutir) uma filha pela janela, piorando (até porque não fomos muito inteligentes em achar uma saída mais viável e menos nociva) a nossa própria imagem e situação.

Exatamente este lado sombrio que leva por ciúme doentio um homem com boa formação e situação social a balear covardemente sua namorada, ou a um empresário ao se sentir ofendido pelo adultério da esposa a matá-la (que pelo próprio ato poderia ser simplesmente desprezada e abandonada) - citando dois casos policiais também famosos da história brasileira. É o apego a nosso EU que nos leva, muitas vezes, a este lado sombrio, que mais lembra o dos chimpanzés e babuínos quando matam seus semelhantes por simples posição social no grupo, a nossos atos mais brutais, e que não são, propriamente, insanos.

Mas nosso cérebro é mais traiçoeiro que o que apresentei até agora. O nosso cérebro, quando no Homo habilis passou 1 milhão de anos apenas fazendo um único e pouco variado machado de pedra, que nem mesmo poderia ser chamado de um machado, e sim, uma pedra "razoavelmente agradável de segurar e com uma lado minimamente afiado". Ou seja: não tínhamos como fazer, com nossos então cérebros, mais que isso. Já os homens de Neandertal, nossos parentes extremamente próximos, com cérebro significativo (até maior que o nosso), com os mesmo dedos que eu, e até mais aptidão ao ambiente (certamente, com um mínimo de peles, resistiam a um frio que nenhum povo siberiano ou os chamados - até erroneamente - esquimós resistiriam) conseguiram, ao longo de quase 300 mil anos construir uma mínima cidade.

Já nossos antepassados diretos, por 200 mil anos, não conseguiram mais que erguer palhoças, tendas de peles e fazer mais que lanças de chifre e roupas de peles costuradas com agulhas de ossos, somados a quanto muito, uns mil objetos variados, e igualmente, nada que seja parecido com nossas mais antigas cidades. Mas o motivo não é cerebral.

Tanto o motivo para esta estagnação não é cerebral que qualquer neurocientista dirá, que se uma criança de 100 mil anos atrás, habitando os lagos do Oriente Médio, fosse educada desde a primeira infância nas mesmas escolas de seus filhos, poderia perfeitamente ser um indivíduo mais capaz que qualquer um de seus próprios filhos. A base cerebral já estava ali, mas faltava alguma coisa.

"Machado" de habilis e pontas de lanças de neanderthalensis e do 'Povo de Clovis', já um sapiens.

Por outro lado, há aproximadamente 10 mil anos, de pequenos agrupamentos passamos a cidades, de cidades a estados, e nestes estados, de trapos ao redor da cintura a finas jóias, a muralhas, pirâmides e medições matemáticas das dimensões do planeta.

Nota: Percebamos que esta evolução da civilização não foi de modo algum homogênea, pois embora com questões pontuais superiores às européias (Astronomia e cálculo aritmético, por exemplo), não podemos comparar, e a história assim o prova, a capacidade em diversos campos das civilizações americanas pré-colombianas com os colonizadores. E podemos comparar, claramente para nossos objetivos, os sacrifícios humanos rituais para se obter chuva com a religiosidade euroéia, ainda que destacada nela a Inquisição Espanhola. O processo civilizatório, como humano que é, possui muito do estocástico que caracteriza o biológico que é o humano.

Mas se não houve aumento da massa cerebral nem de sua estrutura, o que causou tal processo de aceleração?

Lembremo-nos que prometi um argumento cristalino. Pensemos, primeiro, num meio de troca de informação atual, relativamente formal como a Wikipédia. Eu posso não saber tudo, aliás, nem uma parcela significativa, de qualquer assunto, mesmo naqueles que tenha formação acadêmica e uma certa experiência. Por outro lado, com base num texto de um autor da Wiki em inglês, como traduzo inglês técnico, posso passá-la para o português, e por um simples acaso, posso saber de um detalhe que ali se acrescente, aumentando o conhecimento coletivo entre eu e este suposto e modelar "autor anglo-saxão". Pois bem, agora, eu e este autor temos, coletivamente e a disposição, um conhecimento maior que o nosso individualmente. Mas percebamos que o conhecimento ainda é a soma dos nossos (desprezando que parte do conhecimento seja superior a nossa memória ou colocação eficiente do conhecimento quando necessário sem substrato de armazenamento algum - em outras palavras e exemplarmente, não psso apresentar uma palestra sobre extração líquido-líquido sem ler alguma coisa - mas esqueçamos este detalhe para chegar ao meu argumento.

Em paralelo a nós, um derminado autor em espanhol (digamos) desenvolveu um artigo sobre uma construção em física-teórica aplicada e aplicável à extração líquido-líquido, que é a lei da partição de Nernst que é superior neste ponto a tanto o modelar autor em inglês quanto o pobre "luso" que vos escreve. Ainda não temos algo que seja superior a soma dos três pobres autores em esforço de se somarem. Mas neste momento, por um detalhe de meu passado (lembremos dos velhinhos que não matamos) pesquiso um pequeno artigo sobre absorção de um corante (assunto que muito tempo atrás estudei) que é tratado pela lei da partição de Nernst e que guarda relação com extração líquido-líquido e resultará em questões de tratamento de efluentes.
Este acréscimo pequeno, que chamaremos numa maneira matemática de dC, um diferencial, um acréscimo infinitesimal de conhecimento, que embora não seja novo "para mim", não seja novo para o grupo anglo-hispânico-lusófono que está construindo uma teorização sobre extração líquido-líquido na Wikipédia, é novo "no autor" do artigo, no caso, os pesquisadores Mariana Mori, Ricardo J. Cassella, causará uma flexão da curva do conhecimento adquirido e construído.

Ou seja: iniciou-se, aqui "localmente no tempo", uma aceleração do conhecimento possuído.

Retornando a determinado grupo nômade no sul do Nilo, pode ter sido por um processo similar que lanças de pontas de chifre foram substituídas por pontas de cobre, e a metalurgia deste cobre recebeu detalhes de tratamento com cinzas de determinada árvore, e de acréscimo em acréscimo de informação obtida e memorizada no coletivo, ergueram-se pirâmides e mediu-se matematicamente o diâmetro da Terra.

Matematicamente, quando o crescimento se soma entre pessoas que possuam suas parcelas, ele cresce aritmeticamente. Quando se multiplica neste aritmético por uma população em crescimento (a população humana na época das grandes pirâmides do Egito não passava de 35 milhões de habitantes, menos que o estado de São Paulo e menos que a aglomeração humana que é hoje Tóquio ). Disto, o crescimento acrescivo apenas pelo conhecimento individual recebeu aceleração pelo aumento dos indivíduos. Mas os indivíduos, trocam informação, e com ela, por mecanismos que na verdade são lógicos (e estes, linguísticos), controem novas combinações de conhecimento, como vimos no meu pessoal exemplo, e combinatória dispõe de um fator fatorial de expansão (parece um pleonasmo, mas não é), e como aprendi lá em Cálculo I, no básico da minha faculdade de engenharia, nenhuma progressão cresce mais rápido que a fatorial. Por este motivo, quando, mesmo sem cérebros crescentes, a humanidade atingiu uma determinada "massa cerebral crítica", o conhecimento "explodiu", e agora, com mais meios das combinações de conhecimento poderem ser feitas, com mais meios de serem trocadas, armazenadas e combinadas coletivamente, se acelera , rumo à "singularidade" , principalmente propulsionada (e aqui diria sinergizada e acelerada) pela lei de Moore, que repetidas vezes trato.

Mas apesar desta aceleração, os monstros que estão guardados nas profundezas do sistema mente/cérebro humano não encontram correspondente aumento, melhoria nem expansão, nem mesmo, um interno entender nem de si, nem do mundo, correlato a este crescimento e sofisticação coletiva.

Um exemplo é que o mesmo impulso que nos levava no passado a admirar aquela fêmea de quadris próprios para a reprodução, ou aquela fêmea jovem apta pela idade à reprodução (e nada mais que isto), é o mesmo impulso que leva homens da minha idade (44 anos) a seduzirem (num nível digamos mais afetuoso e no fundo sincero e honesto, ainda que distorcido dos valores aceitos pela sociedade universalmente), a manterem relações à força (num nível mais animalesco) ou mesmo, no extremo da perversidade, depois de se satisfazerem, e as vezes antes - desculpe, mas é impossível tratar este tema sem ser desagradável - quando os mecanismos morais do cérebro são completamente deformados/incapazes. Embora não goste de graduações simplistas e monodimensionais para tratar o humano, acredito que com estes três parâmetros de larga faixa, abordei todos os casos ainda que de modo excessivamente abrangente e superficial.

Abordando esta questão por outro flanco, como sempre encontro até nos meus textos o tema em Filosofia que hoje me atrai, que é o paradoxo sorites levado à falácia, percebamos que ao Mao Tse-Tung teve um romance com uma menina (note o meu termo) de 12 anos, o que era perfeitamente aceito pela sociedade chinesa de então, Maria Antonieta casou-se "sob a benção da igreja" aos 14.

Mas ninguém sem passar por pesada discussão pode dizer que um homem de 44 anos ter atração por uma menina de 10 anos seja moralmente aceitável, assim como também não 'naturalmente' aceitável.


Lolita, clássico sobre o tema pedofilia, e Ava Gardner, que chegou a ser chamada, elogiosamente, de "o animal mais belo do mundo". Ao demonstrar atração pela adulta, você será não será motivo de repulsa alguma, mas terá de pensar muito bem no que dizer sobre a primeira.



Portanto, a questão é um tanto a mais que o valor idade (e aqui sorites, pois 12 é igual a apenas 10+2 anos), mas um contexto socialmente aceitavel, pois biologicamente construído, pois necessário à própria sobrevivência da humanidade, desde os seus mais primitivos grupos, pois o estupro de meninas biologicamente improdutivas para a reprodução era danoso a espécie. Lamento se o texto é desagradável, mas a questão é fundamentalmente esta, e por isto mesmo, sobre tal construção de princípios/instintos humanos, construímos as leis, e mesmo com tolerâncias sociais de 12~14 anos, por exemplo acima, não toleramos significativamente menos, mesmo com o rigorismo de 2 anos, e no passado (e nem tanto, vide o mundo muçulmano), determinamos apenas pela primeira menstruação (a capacidade comprovada - a priori - de reprodução) o que seja pedofilia e o que seja um casamento - num sentido mais específico ao meu caso da definição de pedofilia.

Por um motivo similar, o mesmo para a pedofilia homossexual, que não guarda relação com a reprodução e sim com a capacidade do grupo com um todo de se reproduzir e possuir liberdades, o que fez no passado, por exemplo, peculiares comportamentos sexuais, como os bem descritos em O Banquete , de uma "homossexualidade afeminada" masculina não ser bem aceita pelos gregos (espero que os termos marquem o que quero expressar), mas uma "homossexualidade viril" masculina a ser aceita e até, como consta nos discursos nesta obra, dever ser estimulada entre soldados gregos.



Citando soldados e lembrando dos grupos de combate e policiais que citei anteriormente, o cérebro humano, por sua posição diria esquizofrênica entre um comportamento afetuoso de bonobo e agressivo de chimpanzé, permite que apresente determinadas, com digo e já citei, "dicotomias morais". Um policial de grupo de ações táticas, notoriamente, são indivíduos que quando no cumprimento do dever, não titubeiam em disparar estourando a cabeça de um criminoso. Embora este ato pareça natural na vida humana, não é. Uma prova disto, foram os levantamentos feitos pelas forças armadas estadunidenses na 2a Guerra Mundial, quando se percebeu que soldados no Pacífico seguidamente titubiavam em atirar em seus inimigos. Desta constatação, desenvolveu-se procedimentos, técnicas de treinamento visando quebrar tais bloqueios morais (prejudiciais no caso). Estes métodos, incluindo uma certa "anulação do eu", na verdade são uma recuperação dos métodos que os samurais conheciam há séculos, os romanos conheciam igualmente e que são, de certa maneira, o fazer surgir o nosso "lado mais chimpanzé". Exatamente este lado fazia os soldados romanos lendariamente "matarem até os animais domésticos" e os soldados japoneses terem enterrado vivas mulheres e crianças na China, deixando-se filmar pisando em cima da terra.

Claro que pela eficiência típica desenvolvida pelo homem durante o produtivo e brutal século XX, conseguiu-se o pretendido, mas exatamente este sucesso levou soldados estadunidenses a fazerem colares de orelhas na Guerra do Vietnã. Para entender o que seja exatamente este método, assista a primeira metade de Nascido para Matar (Full Metal Jacket, 1987), de Stanley Kubrick.

Entendamos que exatamente o que faz um soldado entrar numa vila e matar mulheres, velhos e crianças em pleno século XX é o que pode fazer, no caso de uma filha ou irmã sua estar nos braços de um assaltante com uma arma na cabeça, ser salva. A capacidade de separar ações ditas morais e não morais, conforme o caso e necessidade, é também uma das razões de nosso sucesso como espécie e seu processo civilizatório.

Um retorno deste procedimento mental é o que faz, por exemplo que me é também marcante, um policial experiente, ao chegar a uma casa, ser incapaz por puro nervosismo de libertar uma menina que estava sendo torturada, exatamente porque seu cérebro é perfeitamente normal, embora garanto que noutra situação, seria plenamente capaz de ter "estourado os miolos" de um assaltante e aguardar, sem o menor tremor, tomando uma água mineral, a perícia, no local do crime. O mesmo conjunto complexo de mecanismos cerebrais, por um caminho transverso, é que levou a uma mulher adulta, de relativamente boa situação social, com todos os recursos materiais, a torturar a menina em questão.

Você pode achar que não se encaixa nos casos acima, leitor, mas assim como a esposa grávida de um conhecido, que ao ver um assaltante dentro de seu quarto, avançou sobre este armada com uma tesoura de unhas e o feriu com alguma gravidade no rosto, pode ter certeza que também como eu, quando esbarrei por absoluto descuido (e porque filhotes humanos são animais bastante perigosos, principalmente para si mesmos) num shopping, mesmo não sendo nada nem de perto grave, passei minutos transtornado e tremendo - e tenha certeza, por determinados fatos no meu passado, e até avaliações, teria sido muito apto em não titubear em atirar se fosse um policial. Somos animais muito peculiares nestas dualidades, nestas ambiguidades de atos, e nossos mecanicismos cerebrais mais profundos ditam muito de nosso comportamento no dia a dia e pela vida toda. Aqui, concordo mais uma vez com Freud, quando percebo que o indivíduo normal não é o que se comporta passivamente como uma ovelha a caminho do matadouro, mas também não é o que permanentemente se comporta como um predador enfurecido. A normalidade estaria no meio termo entre estas duas tendências, "Eros e Tanatos".

Um grupo SWAT e um sniper, respectivamente, a ação do cérebro humano na formação de grupo de caçadores e da anulação de determinados bloqueios morais.


O nosso compostamento "moralmente dual" é o que faz adolescentes serem cruéis, e termos de, em avanço sobre o cruel método de aprendizado e amadurecimento da elite espartana a chegarmos a moderna educação de mútuo respeito e tolerância, mas não conseguindo de todo eliminar o que seja o que está em voga tratar como bullying (o qual, com infância fisicamente frágil e inteligência precoce, agradeço com todo o coração por ter, felizmente, paradoxalmente moldado muito do meu caráter e iniciativa - tive minha vivência espartana), que pode ir desde os primatas pelados judiarem por rituais até relativamente suadáveis dos "batizados" de esportistas iniciantes, até pintar com tinta moradores de rua , e em casos mais desmedidos (similares ao bater mesmo muito numa criança, até o desmaio ou quase morte, e confundir isto com a gravidade de matá-la) de queimá-los (aqui, dado o número, melhor não citar notícia específica, e sim uma pesquisa no Google).

Por estas e por outras, e talvez muitas mais, que concordo com meu amigo advogado criminalista, que pouparei o nome, que o senhor Alexandre Nardoni, na verdade, é inimputável, e deve ser, pela própria incapacidade de medir seus atos, tratado, muito provavelmente pela vida toda. Mas esta é uma opinião minha, sustentada pelos argumentos deste amigo, completados pelas minhas avaliações, e como se diz no popular, "cada cabeça, uma sentença".

Uma pausa: Voltando aos pedófilos, recentemente tive contato com determinado livro sobre pedofilia. Claramente, ele comete o mesmo erro - na verdade, uma simplificação exagerada - que o pai da sexologia moderna, Alfred Kinsey, cometeu ao tratar a sexualidade humana, ao criar uma graduação monolinear sobre o comportamento sexual humano entre o heterossexual e o homossexual, a dita "escala de Kinsey".

Não podemos afirmar que todo o pedófilo tenderá à agressão e a imposição pela força de seus desejos. Pedófilos em si não são estupradores (assim como obviamente, o inverso, existem perfeitamente estupradores que são incapazes de atacar meninas, assim como obviamente, existem estupradores completamente heterossexuais assim como pedófilos completamente homossexuais e jamais estrupadores, etc). Ao invés de tentar continuar citando exemplos de combinações para sustentar o que acredito que já se tornou óbvio, abordagens como as da escala de Kinsey para tratar o humano são úteis num primeiro momento, mas percebamos que o humano é muito mais dimensional que uma inclinação num gráfico bidimensional, como vimos ao longo destes agora já três artigos, e deve ser tratado com muitas dimensões de graduações e fragmentações de casos, e como gosto de dizer, o mundo não é tratável por tons de cinza entre o preto e o branco, mas além de inúmeras cores, até por tons sonoros somados as cores, e qualquer tratamento cartesiano simplório ao humano está destinado ao desastre.

Nota 1: A própria grade de orientação sexual de Klein , já bidimensional, mostra-se rapidamente limitada. Por este motivo, considero também que graduações entre o que seja um psicopata, um criminoso e uma pessoa que cometeu graves erros momentâneos e nunca mais cometíveis, assim como qualquer graduação dentre estas já minhas impostas classificações perigosas, ainda mais quando levadas como científicas para o campo do direito. Por estas e por outras, que um caminho difuso e multiramificado, dentro do que minha ignorância e momentânea, e talvez permanente, incapacidade de me aprofundar determinou, acredito que apenas uma lógica deôntica possa ser válida no tratamento das "coisas morais".

Por este conjunto de motivos, o impedir fisicamente além do interditar/apenar/prender/etc do nosso moderno direito me parecem morais sem discussão, e os modelos de condicionamento, como os brilhantemente mostrados em (A) Laranja Mecânica (livro e filme , coincidentemente, também de Stanley Kubrick) são discutíveis, assim como julgo que a "castração química" para pedófilos e estupradores também o seja.

Nota 2: Em aula de medicina ligada à atividade industrial em petróleo, fiquei a par que determinado bairro da região metropolitana de Campinas possui um dos mais altos índices de agressões de maridos à esposas grávidas do Brasil. Propus a professora que o mecanismo talvez seja a reação do macho primata caçador a ter mais uma cria para sustentar. Após alguns segundos de silêncio pensativo e olhar fixo, percebi a típica reação humana dos 'olhos brilharem' e aquela frase aproximadamente "é, pode ser isso...". Posso estar redondamente enganado, mas muito de nosso recente crescimento de agressividade nos centros urbanos se deve a um mecanismo profundo quando do excesso de população em confinamento, que já se evidencia marcantemente nos nossos parentes roedores.

Voltando a escala humana e suas leis, por outro lado, como sou um primata pelado típico, com minhas contradições, defendo que a pena de morte, o aprisionamento perpétuo, a internação vitalícia, a própria castração química e até o condicionamento sejam necessários social e civilizatoriamente.

Perceberam meu dilema? (Que acredito que não seja só meu.)

Soldados soviéticos em combate e soldados da SS num gueto. Os dois grupos realizaram atos brutais em larga escala. Mas os primeiros estavam num contexto de moralidade, os segundos não. Os dilemas que derrubam uma generalização dos argumentos morais de Kant não poderiam achar exemplos mais estatísticos.


A vida não é feita de flores (e como vimos para nossa história felizmente), e como o próprio Kant percebeu, não matar é um universal, mas exatamente impedir que sua sofisticada e civilizada pátria, anos mais tarde, cometesse os piores atos da história da humanidade, necessitou de um matar absolutamente moral, pois necessário, para a própria sobrevivência da humanidade com um todo.

Ninguém no humano ultrapassa o humano, nem em ter de ser, até por necessidade, o primata perigoso que sempre foi.