sábado, 28 de maio de 2011

Presságios Sobre Nosso Sol III

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Tratei em 'Presságios Sobre Nosso Sol', blogagem I e blogagem II, sobre as questões de "super-erupções solares", emissões gigantescas de matéria superficial* e coronal por parte de nossa estrela e do quanto difícil seria acontecer, com consequências realmente catastróficas para a Terra e sua frágil vida, como apresentado no filme Presságio.



*O conceito do que seja "superficial" para o Sol é um tanto mais complexo que este termo, que pode até lembrar algo como nossa crosta terrestre. Para tanto, ver Estrutura solar.


Mas a questão é que "mostrar o quanto é difícil" sem números, cálculos, e "coisa alguma" em Física dá praticamente no mesmo. Então dispus-me a colocar a coisa num modelo físico simples, quase de secundário, para que se entenda o quão favorável é a posição de nosso planeta para estarmos protegidos deste tipo de evento. Construiremos então um modelo de comportamento físico simples dos gases ao sair do Sol, um modelo "facão", como costumo dizer (uma ironia com a navalha de Ockham).

Primeiramente, consideraremos gases saindo do Sol como um gás ideal.

Obs.: Esta consideração é na verdade um absurdo, e a usaremos apenas para simplificar nossos cálculos de maneira extrema. Um gás ideal pressupõe interação nula entre as partículas do gás, até as considera pontuais. O Sol, assim como a maior parte das estrelas em atividade de fusão, é composto de plasma a alta temperatura, sob intensos campos magnéticos, e suas partículas apresentam alta intensidade de interação, tanto, que até visualmente, comportam-se de maneira similar a um líquido em alta convecção.Para uma amostra do quão complexa é a modelagem de plasmas, Plasma modeling.

Lembremos que a equação de Clapeyron determina que para os gases ideais:

PV = nRT

Consideremos, por hipótese, que 10% da massa do Sol será expelida (atentem para o absurdo que é este valor que aqui coloco), o que dá 1,9891 × 1029 kg.

Consideremos que a sua massa molar média (de composição), seja uma média ponderada entre a massa do hidrogênio e a média da massa do hidrogênio e a massa do hélio, pois para simplificar nossos cálculos, o Sol tem a composição confortável de 74% em massa de hidrogênio e 24% em massa de hélio). Com isto, teremos, em números bem redondos, massa média de 2,5 kg/mol. Isto nos leva a que o número de moles da massa emitida será de 7,9564 × 1028 moles, nosso n.

Obs.: Aqui, cometi um sutil, e nem tanto, atropelo, pois o Sol possui um altíssimo gradiente de densidade. Seu centro é o local mais denso do sistema solar, com densidade de 150 g/cm³, aproximadamente umas 5 vezes mais denso que a mais densa materia trivial em nosso planeta na sua superfície, que são os metais irídio e ósmio, mas sua densidade média é de uns 1,4 g/cm³, o mesmo que muitos solventes clorados que usamos em diversas aplicações, menos que por exemplo, o ácido sulfúrico concentrado. A razão destas propriedades bizarras para nossos parâmetros de terráqueos, podemos simplificar, é sua gigantesca coluna de fluido, no caso, de uma "profundidade" de quase 700 mil quilômetros, e obviamente, sua imensa gravidade.



Como nossa emissão se dará a partir do material mais externo, consideraremos esta densidade média, que me parece ser um valor até honesto, pois poderíamos, pelo próprio termo "médio", usar uma menor. Esta densidade nos dará, para a massa que expeliremos, um volume "enquanto junto ao Sol" de 1,4208 x 1026 m³.

Consideraremos a temperatura que tal massa parte de seu "acoplamento" à massa solar como sendo do dobro da temperatura da superfície solar, o que me parece também um valor honesto, o que nos dá uns 11600 K.


Desejamos T2, na posição da Terra, portanto, consideraremos que o volume que sai do Sol, que podemos afirmar como sendo originalmente de uma "casca esférica", avança sem grandes expansões no sentido radial em direção à Terra, apenas ampliando sua "área" até uma nova casca esférica que tenha o raio da órbita da Terra (150 bilhões de metros) e passe a ter uma espessura de 1 milhão de km, ou 1 bilhão de metros (a diferença de considerar uma espessura como plana e como realmente é, que é curva, neste caso, é insignificante).

Um esquema simples, e completamente fora de escala para qualquer elemento que represente, de nosso modelo:



Notemos que neste cálculo todo, desprezamos a perda de temperatura por irradiação, e consideramos o processo inteiro como uma expansão adiabática (sem perdas para o ambiente, o que novamente é um argumento extremo, pois o espaço é o melhor meio para a perda de calor por radiação).

Pelos números acima, a casca esférica de gases terá então área de 4piR²=2,827 x 1023 m², que com a espessura de 1 x 109 m nos leva a um volume de 2,827 x 1032 m³.

Lembremo-nos:

P1V1=NRT1


P1.1,4208 x 1026 m³ = 7,9564 × 1028 . 8,314 J·K−1mol−1.11600K

P1 = 54007200 N/m² (ou Pascal, o que corresponde a umas 533 atmosferas, um valor bem razoável para o ambiente solar)

Obs.: O valor pode parecer excessivamente alto mas é o que faz um gás leve como uma mistura de hidrogênio e hélio chegar a atingir a densidade de um líquido mais denso que a água em nosso ambiente dito "normal".



Aqui, observemos que o nuvem de gás possui massa 1,9891 × 1029 kg, como vimos acima, e volume de 2,827 x 1032 m³, que nos dá aproximadamente uma densidade de 7,036× 10-4 kg/m³, o que é uma densidade umas 1700 vezes menor que a densidade do ar ao nível do mar, que gira em torno de 1,2 kg/m³.

A partir destas condições, lembraremos que a expansão que adotamos é adiabática em energia, mas se processa no vácuo, e ainda que a limitemos produzindo uma casca de menos de 1% do raio da expansão, a consideraremos uma expansão livre, que nos leva a relação:

PiVi=PfVf


O produto do volume e da pressão iniciais é igual ao produto da pressão e volume finais. De onde temos:



54007200 . 1,4208 x 1026 m³ = Pf . 2,827 x 1032 

(Tenho de confessar: meu cérebro ainda não funciona bem para equacionamentos expressos no mundo da informática, mesmo em LaTex. Portanto, cortemos no razoável a expressão das unidades, ainda que as mantenhamos coerentes e homogêneas.) 


Pf  = 27,14 Pa


Retomando, como aqui Pf é P2, e o processo se dá por uma expansão livre adiabática de um gás ideal, apliquemos:



T2 = T1 * {(P2/P1)^[(γ-1)/γ]}

Observando que γ para gases ideais gira em torno de 3/2 a 5/2, mas aqui, usaremos um valor médio de 4/2, ou, simplesmente, 2, pela mistura de gases diatômicos e monoatômicos com que estamos lidando (respectivamente, o hidrogênio e o hélio).

T2 = 11600 * {(27,14/54007200)^[(2-1)/2]}

T2 = 11600 * [5,025 x 10-7^(1/2)]=11600 * 7,0889 x 10-4



E finalmente, T2 = 8,2 K.


Uma outra maneira de se entender tudo acima, que consideraria bastante mais simples, é considerar toda a massa do Sol como passando a dispersar-se, já sem reações nucleares, pois não haveria pressão para tal, e desta, as temperaturas necessárias, numa esfera com raio igual a órbita terrestre. Sendo a massa do Sol 1,9891 × 1030 kg, e o volume desta esfera hipotética 1,4137 × 1025 km³ ou 1,4137 × 1034 m³, ficaríamos com uma densidade de aproximadamente 1,407 × 10-4 kg/m³, ou para ficar em números mais perceptíveis, 0,14 g/m³, sendo que a densidade do hidrogênio nas condições ambientes é de 0,08988 g/L, ou 89,88 g/m³, ou 642 vezes maior. Em suma, o Sol, diluído nos volumes típicos das órbitas dos planetas, é um gás bastante rarefeito.

Portanto, temos que os gases chegarão à proximidade da Terra com baixíssima temperatura, mesmo considerando todos os exageros e limitaçõe favoráveis ao argumento do filme Presságio.



Tudo isso é válido, porque os mecanismos nucleares e até diria a geometria do sistema são do Sol como anã amarela da sequência principal, no seu caso, operando fusão pela cadeia próton-próton. Quando o estoque de hidrogênio (estes prótons) acabarem e no seu centro a taxa de núcleos de hélio for dominante, o Sol começará a se comportar como uma gigante vermelha, na qual a força de gravidade causa a pressão que produz as reações nucleares de fusão de núcleos de hélio (no caso do Sol em seu futuro, pois estrelas maiores "queimam" ainda outros núcleos), mas não consegue manter seu tamanho, digamos, sob controle, e o excedente de calor produzido começará a expelir suas camadas externas ao ponto de se comportar como uma enorme nuvem rubra de gases aquecidos que atingirão inclusive a órbita terrestre (o que implica, para o raio do Sol, em este crescer umas 200 e poucas vezes). Neste caso, não seremos atingidos por flares de uma estrela com erupções, mas estaremos nadando em suas camadas atmosféricas mais externas, como um pedaço de mussarela imerso no fogo. [NOTA]


A Terra sendo absorvida pelo Sol em sua fase de gigante vermelha. Para um vídeo sobre este fenômeno, Red Giant...And the Earth Burned.

Enquanto o caso que analisamos pertence à hipótese a ser analisada e ao argumento de uma ficção, este quadro apresentado pertence aos fatos claros e inexoráveis pelos que passam todos os planetas dentro de um determinado raio de distância de suas estrelas. Pela nossa posição e atual estágio de evolução de nossa estrela, podemos, quanto às erupções, dormir mais que tranquilos pelos próximos um ou dois bilhões de anos (pois primeiro enfrentaremos problemas de aquecimento pelo aumento de produção de energia pelo Sol), antes dele entrar na fase em que nos absorverá, restando apenas preocupações quanto a efeitos eletromagnéticos em nossos sistemas de comunicações e distribuição de energia elétrica.


Nota: E um tanto tardia. Talvez o leitor me pergunte como o Sol, em seu atual conjunto de características, expandido para o volume de uma esfera de raio da órbita terrestre não calcine a Terra, como julgo demonstrar naquele parágrafo, mas no futuro se expandirá até derreter-nos. A resposta é que o Sol se expandindo na sua atual composição, diminuiria suas reações nucleares que aqueceriam esta nuvem de gás em que se tornou, exatamente pois a pressão em seu centro diminuiria, mas quando se expandir como gigante vermelha, tal se dará porque as reações em seu centro serão muito mais energéticas, e manterão a massa de gases em expansão absorvendo radiação e se aquecendo. No primeiro caso, estaríamos dentro de um bolsão de gás que pouco antes era uma estrela, e no segundo, estaremos dentro de uma estrela, em plena atividade de uma fase turbulenta, que por fim, a levará à extinção.



Anexos

Tenho alguns problemas eventuais com matérias deste site, mas este artigo pode ser bastante interessante:

Outros links:

Um conceito que deve sempre ser conhecido por quem se interessar sobre Astrofísica:

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segunda-feira, 16 de maio de 2011

Humanidade Como Força Geológica V

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Os animais e vegetais que nos orbitam

Ou "como a humanidade tornou-se além de força geológica, força ecológica e seleção natural"

Para onde quer que olhemos a presença humana, seja no meio urbano, seja no rural, percebemos que as espécies que exploramos tornaram-se as dominantes. Onde antes havia Mata Atlântica, por exemplo, já houve e ainda há cafezais e agora explodem plantações de cana de açúcar e até eucaliptos e pinheiros. Onde haviam pradarias e cerrado, é plantada soja, especialmente com o fim de alimentar-se desde porcos em terras distantes até galinhas e vacas em nossas proximidades.


Por sua vez, onde havia no máximo, em tamanho, antas e onças que as predavam, controlando sua população, agora colocam-se as mesmas vacas que serão nutridas de distante soja.

Substituímos ecossistemas inteiros por arremedos de ecossistemas, sempre em permanente desequilíbrio, no limiar do colapso, mantidos em tal perigoso estado pelo dispendio de energia e nosso engenho. Ou alguém em sã consciência afirmaria que o gado do cerrado e das áreas desmatadas da floresta amazônica manteria seu número sem a ação humana por uns 5 anos?

Já nossos "ecossistemas" agrícolas, apesar de recentes programas da eliminação da ação da química no controle de insetos e outras pragas (e nem tanto, vide-se o uso de glifosato), ainda depende continuamente da ação humana, e destacaria nesta, com o uso de combustíveis fósseis. O próprio solo não sustentaria tal ritmo de produção vegetal em monocultura (a universal na biologia 'geração de biomassa') sem a produção e aplicação de fertilizantes, demandando tanto na matéria prima como na logística combustíveis fósseis.



Como nossa população mostra-se crescente, e neste crescente de número ainda se acrescenta um crescente de necessidades (ou melhor dizendo consumo/desejos), temos a necessidade de mais terras para possibilitar mais pasto ou produzir ração e nossos alimentos vegetais, sobre os quais, agora, acrescentam-se as fontes de etanol e óleos vegetais, dada não a extinção de nossas fontes de energia fósseis, mas a crescente demanda por combustíveis, componente de uma perigosa e impossível ao final demanda exponencial de energia.

Mas devemos alertar que a destruição de terras selvagens para a produção de biocombustíveis, no Brasil, é ainda menor que a de outras nações, como a Malásia. Pelo menos, por enquanto.

A plantação de palmeiras de óleo adjacentes á floresta em Sabah, Malásia. Foto por R. A. Butler (news.mongabay.com).


No ambiente urbano, basta uma olhada em qualquer praça para vermos que pombos tem uma população explodida, para os edifícios, pardais, nos tetos de determinados prédios, gatos (afinal de contas, sobram pardais para alimentá-los, fora nossos restos). Já na América do Norte, encontram espaço urbano o guaxinim e o urso negro, capazes de viver de nossos lixos com excedente de alimentos (e seus relacionados roedores), sem falar em toda a América do puma ou onça parda (o maior dos gatos), que seguidamente encontra-se com algum morador ou trabalhador da construção civil, pois afinal, sobram gatos, cachorros e nossos animais de abate como galinhas e porcos para alimentá-los em nossas periferias urbanas.


Uma onça parda encontrada numa residência na cidade de Vinhedo (eptv.globo.com).


Nem teremos de neste texto destacar a presença de camundongos, ratos (o "rato de forro") e as ratazanas, que dependem de nossos grãos e alimentos diversos e rações de nossos animais domésticos, assim como de nossos esgotos (no caso das ratazanas) e evidentemente, as onipresentes baratas.

Até mesmo os répteis como as lagartixas encontram seu nicho em nossos ambientes domésticos. Morcegos vivem em nossos prédios. Criamos um número infindável de relações ecológicas contendo nossa presença, hábitos e excedente de nutrientes como pivô de todas estas criaturas. Mesmo no vegetal forçamos a existência de nichos urbanos, basta ver nossos mais arborizados bairros e seus jardins. E devemos destacar que toda esta reprodutibilidade, em explosões de populações, é fomentada por nossa crescente demanda de energia e produção de alimentos.

Somos uma força não só geológica, ao modificar paisagens, removendo montanhas e modificando rios, mas também uma força ecológica, ainda que no mais profundo do termo, nossa ação vai de encontro ao que mais naturalmente seja chamável de ecologia como sinônimo de um 'sistema ecológico equilibrado'.




Para o homem verdadeiramente ético toda vida é sagrada, mesmo aquela que, sob o ponto de vista humano, nos parece inferior. Ele só fará distinções de caso para caso e sob a pressão da necessidade, por exemplo quando a situação o forçar a decidir qual a vida a ser sacrificada para conservar uma outra. - Albert Schweitzer


Anexos

É recomendável, para aqueles que acham que plantações de pinheiros e eucaliptos são "reflorestamento", se familiarizarem com o conceito de deserto verde.

Recomendo também:
Para a questão dos fertilizantes serem atrelados aos combustíveis fósseis como sua matéria prima:
Para a problemática da plantações com foco na produção de biocombustíveis:
Sobre "guaxinins urbanos", basta a bem referenciada Wikipédia em inglês: Urban raccoons

Pequei no passado por já não ter recomendado o primoroso texto de Milton Mendonça Jr, Professor do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da UFRGS, publicado no jornal Zero Hora:
    Sobre a questão da água na agricultura, suas limitações e seus problemas:

    WASHIGTON CARLOS DE ALMEIDA; A ÁGUA NA AGRICULTURA ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DA ÁGUA NA AGRICULTURA. - http://www.abda.com.br/
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    Extras

    Os ursos eslovacos e seu comportamento:
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    quarta-feira, 4 de maio de 2011

    Aliens (ou vida extraterrestre) I

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    Como a maior parte das pessoas hoje (digamos claramente: jovens) não são muito afeitos a ler ficção científica mas muito a assistir filmes, tratarei neste artigo do tema em torno de filmes, e aqui e ali, uns pingos de literatura da área.


    Os arquétipos


    Viajantes microscópicos



    A ficção científica já colocou formas de vida no espaço interestelar e interplanetário, destacadamente a microscópica, como em Enigma de Andrômeda.

    Confesso que não sou muito simpático a esta ideia. O espaço é permeado de radiações ionizantes, até as mais intensas, que são os raios cósmicos. A própria química interesterlar/interplanetária é bastante dinâmica pela ação dos raios ultravioleta, raios X e raios gama, sem falar das partículas aceleradas, modificando até mesmo a composição em átomos (por alterações dos núcleos atômicos) constantemente.

    No filme (a minissérie de TV, apesar da esmagadora capacidade de produção em efeitos especiais de hoje, é um desastre ecologistóide/viagens no tempo completo) a forma de vida é capaz inclusive de transformar energia de uma explosão nuclear em sua fonte de energia bioquímica, o que me revela que o roteirista e outros não alertaram Michael Crichton de que energia de partículas e temperatura permitem apenas determinados estados (fases, como preferimos mais tecnicamente) da matéria. Assim, a superfície do Sol e até mesmo determinadas profundidades de Júpiter, por exemplo, não permitem determinado tamanho de moléculas complexas, e até mesmo, nem mesmo uma única molécula, e ao se chegar a determinada temperatura não teríamos nem mesmo átomos íntegros. Explosões nucleares de fissão vitrificam solos e volatilizam ossos, que são na sua parte inorgânica, em termos de engenharia, um material refratário.

    Neste ponto, a criatura "programa" de Vírus, a produção "terrorzenta" de 1999, me parece mais plausível, ainda que a dissipação por ruído e pelas próprias leis da Mecânica Quântica (que impedem inclusive determinada segurança em podermos nos comunicar por rádio com civilizações extraterrestres) me leva a ter confiança em que tal tipo de ser vivo ou comunicação (ou ataque!) não seja possível.

    Apesar desta, usemos meus termos, 'imensa babada', a cena do pulso cortado e liberando poeira de sangue coagulado cristalizado é inesquecível, e tal metabolismo não seria um absurdo.

    Mas esquecendo que a pobre coitada forma de vida advinda do espaço teria (se sobrevivesse as incandescentes temperaturas de entrada na nossa atmosfera) de enfrentar bilhões de anos de evolução de bactérias que foram capazes de digerir tudo, desde óxidos de ferro e sulfato, passando, evidentemente, por celulose de belas plantas floridas e até a pele, musculatura, pulmões e ossos desde peixes até macacos pelados munidos de poderosa (e nem tanto) tecnologia médica. Noutras palavras: mesmo dizimando todas as formas de vida mais complexas de nosso planeta, teriam de enfrentar as mais simples. Deixemos os imprudentes aliens de Guerra dos Mundos para adiante e lembremos, e no futuro talvez até tratemos, que somos as formas mais simples modificadas, e fomos (nós, os complexos) mais extintos por climas, vulcões, eras glaciais e impactos meteoríticos de que pelas terríveis bactérias que dissolveriam o mais resistente organismo do espaço (sem falar nos vírus, que até atacam as bactérias).

    Obs.: Devo alertar que vírus (os terrestres!) são os parasitas por excelência, pois só se repoduzem pelos mecanismos de produção de genética alheios, e portanto, para serem algo - em uma forma similar - a nos atacar, teriam de ter se desenvolvido em algo que fosse a nossa genética, e tal é uma enorme impossibilidade, da mesma maneira que o vírus letal para um cão, um gato ou uma galinha não necessariamente é letal para um humano, e muitos não são letais nem de um destes animais para os outros, quanto mais levando em conta toda a diversidade de vida na Terra. Tanto isto é fato que se pesquisa vírus bacteriófagos, que são moléstias para bactérias, para aplicação em medicina e veterinária.


    Um vírus bacteriófago (www.portalsaofrancisco.com.br).


    Mas uma forma de vida encistada, "bacteriana" (no sentido de química simples e básica) poderia chegar a distantes pontos de seus mundos de origem inseridas em corpos celestes blindados por sua própria configuração e dimensões às radiações e temperaturas de entrada. Sua partida seria causada por impactos, como na Terra chegaram pedaços de Marte oriundo de impactos no planeta vermelho. A meu ver, aqui, o problema seria, nas distâncias interestelares, uma bioquímica que fosse estável pelos gigantescos períodos de tempo que seriam necessários para distâncias de anos-luz serem vencidas por velocidades de dezenas de quilômetros por segundo, quanto muito, e contar-se com a sorte de chegarem a algum sistema solar, orbitarem por talvez milhões de anos antes de se precipitarem num mundo agradável, e não serem absorvidos pelas imensas gravidades dos gigantes gasosos (obrigado por nos proteger, Júpiter "O Gordo"!), não colidirem com alta velocidade com um corpo impropício à vida e na colisão, enfrentarem fragmentação de sua "cápsula" ou temperaturas de calcinação, sem falar nas estrelas, que são as senhoras absolutas da absorção de corpos nos sistemas planetários, e fonte de grande parte da radiação que impediria tal fenômeno.


    Insetos vorazes


    Agora falemos de formas de vida mais complexas, que surgiriam num processo evolutivo não porque a vida busca a complexidade, mas porque a complexidade surge em um processo estocástico pelo simples erro, que produz distribuições.

    Tratei disto em:

    Modelos Matemáticos Simples em Evolução - II - O aumento da complexidade do ponto de vista de combinações possíveis

    Lembrando que no Cambriano chegamos a ter dezenas de designs básicos, dos quais sobreviveram apenas entre os mais complexos os cordados (um bacalhau, um elefante e você), os moluscos (lesmas, caracóis e os inteligentíssimos polvos e lulas em suas diversas variações) e os artrópodes (desde os tatuzinhos de jardim, os caranguejos e para desespero de alguma leitora, até as baratas), podemos então supor que num planeta propício, lá também pelos 3 bilhões de anos de existência da vida, surgiriam designs variados, exatamente em acordo com os mesmo princípios e mecanismos que levaram o nosso planeta a ter mais originalidade nos designs básicos que possui hoje (na verdade, nos últimos trezentos a quatrocentos milhões de anos).

    A fauna do Cambriano (uua.cn).


    Assim, neste planeta, poderiam os "artrópodes de lá" passar a desenvolver pulmões (ou algo parecido, diferente dos túbulos funcionando por capilaridade de nossas baratas), e atingir tamanho acima dos três metros que no máximo chegaram os nossos (desprezemos aqui questões gravitacionais) ou passar a desenvolver um esqueleto interno, sustentando o relativamente grande corpo em posições mais verticalizadas (coisa, que até o momento, nossa paleontologia jamais encontrou - as maiores lacraias da história e os maiores escorpiões marinhos nunca conseguiram a posição elevada de uma mísera galinha, quanto mais de um dinossauro, nem mesmo de um de nossos quadrúpedes domésticos).

    Claro que este preâmbulo foi para citar o mais assustador dos alienígenas do cinema, aliás, que levou o termo alienígena a ser praticamente um sinônimo de extraterrestre: a criatura de Alien, o Oitavo Passageiro. Um das características sensacionais desenvolvidas a partir do episódio 3, meu segundo na ordem de preferência, é a sua capacidade de incorporar a genética do ser parasitado na sua reprodução (neste filme, a criatura é mais próxima em postura de um cão que de um humano) e já nos péssimos "Alien x Predador", absorve até a estrutura bucal do caçador "rastafari" do espaço. Descobrimos que bactérias - terrestres, fique bem claro! - possuem tal capacidade em determinado nível.

    Vide "Transformação":

    Mecanismos devariabilidade genética em agentes fitopatogênicos - www.fcav.unesp.br

    Quanto a aspecto muito criativo de seu sangue ser corrosivo, há insetos produtores de substâncias cáusticas,  como a pederina dos potós (Paederus irritans) e os produtores de misturas termogênicas, como o antigamente tão citado pelos criacionistas besouro-bombardeiro (Brachynus crepitans), mas da mesma maneira que o mercúrio nos é tóxico, o cobre, o zinco em determinadas taxas, o cádmio, o chumbo, o arsênio, etc, talvez alienígenas não possam nem se aproximar de nosso sangue com sua hemoglobina contendo ferro, o cálcio e o fósforo de nossos ossos, e até do teor de salinidade de todos nossos fluidos. Talvez nossa urina, contendo nitrados, seja causador de terríveis queimaduras em algum et que nos pretenda como refeição. Mas não me venham citar que alienígenas seriam queimados por água potável, quando nossa atmosfera é sempre cheia de vapor d'água, como em Sinais, pois os furos de roteiro daquele senhor me irritam há anos.

    Paederus irritans e Brachynus crepitans, dois pequenos seres, capazes de produzir respectivamente causticidade e líquidos quentes.


    Mas já criamos no terreno da ficção oceanos vivos (Solaris), algo parecido com um fungo (o pólipo de A Cidade e As Estrelas, romance de A.C. Clarke), uma "amebona" nos dois A Bolha Assassina e até gigantescos cristais no - diria primitivo, não ruim - The Monolith Monsters/Rastros do Espaço, e mais recentemente, mais e mais formas de vida bastante distantes do que temos em nosso planeta, em toda a sua história, vide os até divertidos docufiction, como Alien Planet, da Discovery Channel, e outros similares da THC e NatGeo, aqui já com um tratamento cientificista e didático, que nos poupa, inclusive, de assistir formas de vida saltando do tórax de seus hospedeiros em plena refeição.

    Na verdade, não haveria limites para o que um processo de arranjo de células (se células), completamente estocástico, poderia fazer em sua estruturação, as conformações que seriam possíveis, ao longo de milhões de anos. Já basta ver no nosso quintal, mesmo entre os limitados em tamanho insetos, suas miríades de formas (na verdade, basta você olhar para seu prato de comida, pois devo lembrá-lo, leitor, que é primo muito distante não só da galinha ou da vaca, mas também do pé de alface que come).


    Pelo menos a computação gráfica e a qualidade dos consultores dos grandes orçamentos dos filmes de ficção nos poupa de assistir brócolis de dois metros de altura correndo atrás de moças em trajes de banho dos desastrados filmes de ficção-terror dos anos 50 e 60, embora em alguns momentos, vagens gigantes tenham produzido razoáveis histórias, como nos vários "Invasores de Corpos", e até simpáticos personagens que possuiam as características das plantas de fazer fotossíntese e ficarem felizes com a luz de estrelas, como a belíssima Virginia Hey, no papel de Pa'u Zotoh Zhaan, na série 'modernosa' mas sofrível Farscape, mas tratarei de seres inteligentes/civilizados adiante. Na própria Terra, devemos lembrar, temos uma lesma, a Elysia chlorotica, que por absorção dos genes da provenientes da alga que come, a Vaucheria litorea, disso se aproxima.

    Elysia chlorotica (meubioblog.blogspot.com).


    Mas antes de seguirmos, até porque o citarei de novo, dentro do gênero scifi-terror, tenho de citar Enigma de Outro Mundo (The Thing, 1982), refilmagem de um dos B relativamente sérios dos anos 50 (O Monstro do Ártico/The Thing from Another World, 1951), de John Carpenter, onde a criatura não é amorfa no sentido de uma gosma, como a bolha antes citada, mas sem forma no sentido que vai copiando as formas de vida as quais contamina e absorve. 


    Civilizações

    Sou obrigado a confessar (dado alguns céticos mais radicais, tenho de dizer isso) que guardo muito carinho por dois filmes sobre extraterrestres, ET e Contatos Imediatos do Terceiro Grau, ambos dirigidos por Spielberg, e outro tanto por Starman, de1984, de John Carpenter. Suas mensagens são positivas, tem um tom quase piegas de esperança, bondade, etc, e apresenta os seres humanos sempre no papel dos piores personagens. No mesmo campo, podemos incluir também O Dia Em Que A Terra Parou, neste campo, apesar das diferenças do que chamaria até de "ingenuidade biológica" do primeiro, contra a falta na verdade de uma mensagem mais elaborada no segundo (para que raios precisam os seres de uma aliança de civilizações avançadíssimas exterminar uma espécie e suas obras, se pode forçá-las pela eminente destruição a salvar todas as outras e ainda obterem baratíssimos "jardineiros"? exatamente o argumento do primeiro - mas tratarei este filme mais longamente noutro artigo).

    Percebamos que com exceção de Starman, e o segundo O Dia Em Que A Terra Parou, no qual é dito inclusive "assumi esta forma pois a minha verdadeira lhe seria repulsiva" (ou frase similar), que são mantidas como um mistério, ou ainda de Contato, da qual só se vê algo como uma lula ou medusa flutuante distorcida por uma parede de projeção do ambiente criado para ser agradável à Dra Eleanor Arroway em sua jornada, as formas de vida de ET e 'Contatos' são na verdade, humanizadas e mesmo no caso de ET, que podemos afirmar como uma "criança deformada por um software de tratamento de imagem", ainda mantém uma disposição de órgãos e parte do corpo de um humano e seus parentes mais próximos.

    Gosto de Inimigo Meu, de 1985, o qual também colocaria no terreno das grandes mensagens morais dos filmes de ficção científica, com uma via um tanto inversa de Distrito 9 (neste blog), pois onde o segundo mostra que mesmo os brancos odiando os negros e vice versa, ainda mais odeiam quem seja de outra espécie, e em determinado momento de Inimigo Meu, é preferível salvar um ser com quem eu possa conversar, ainda que o considere feio, do que ter de enfrentar sozinho um predador que julgue mais feio ainda. Mas ainda sim o sábio Jeriba Shigan, capaz de se reproduzir sozinho, esfrega na cara de nós, macacos pelados, que temos a triste realidade de termos de nos completar para perpetuar nossa espécie (ainda que espere a clemência de algum biólogo, pois sei bem que a reprodução sexuada é o que permite ser ainda mais rápida a evolução e a formação, nesta, de populações mais aptas ao meio, o que aliás, já tinha sido observado por vias ainda sem a genética por Darwin, em A Origem das Espécies).

    Basta resumirmos que se os decendentes da "explosão do Cambriano" de cada um dos mundos que permitiu vida (digo 'permitiu' pois defendo que vida não é uma raridade, e sim um produto inexorável da química e da astrofísica/exo-geologia) permitiu um conjunto de designs básicos diversos para seus animais mais complexos (ou animais-plantas, ou fungo-animais, ou qualquer coisa possível no biológico, desde que se mova e possua características que lhe levem a ter um "operador sensorial e lógico"), da mesma maneira que entre nós sobreviveram o conjunto cordados-moluscos-artrópodes, qualquer forma seria possível, e o cenário mais adequado para mostrar-se isso seria o das inúmeras criaturas do cômico mundo imaginado em Men In Black.

    Talvez nada mais chocante para a humanidade que sair de uma nave pousada numa grande praça de alguma grande cidade do planeta algo parecido com uma lagosta, um louva-a-deus, uma lula ou ainda algo que lembre um centauro ou um elefante com uma muito mais hábil tromba (ou duas, três ou quatro trombas), que possua escamas ou penas, ou ainda outro exótico revestimento corpóreo, olhos de calcita, como tiveram nossos trilobitas, e que sejam mais, do ponto de vista do que realmente devemos classificar como o humano enquanto mental e social, mais humano que nós, e após ver nossa surpresa, nos alerte queo relojoeiro não só é cego, mas odeia repetir suas criações.

    Um design básico perfeitamente possível para um extraterrestre (no.comunidades.net).


    Mas quero abordar outro ponto, não ficar na biologia pura e simples. Mas já que temos que para isso colocar vida, provavelmente a partir da evolução de bactérias ou seres simples similares, temos de tratar de seu substrato.

    Pa'u Zotoh Zhaan, única imagem de ficção desta blogagem, pois Virginia Hey merece.



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