quarta-feira, 15 de junho de 2011

Mostre-me o universo... II

e digo que lá não está o deus cristão

2a Parte

Observação inicial: esta deveria ser a primeira blogagem desta série, mas como minha vida seguidamente envereda por uma "turbulência de atividades", resolvi publicar primeiramente a parte já razoavelmente bem acabada, e não "os primeiros capítulos". Espero a compreensão de todos e uma certa estima pela minha preocupação com dar-lhes algo interessante para ler, nessa era em que a informação já deveria ter sido entregue ontem.


Caiu nas minhas mãos, num saguão de aeroporto, o seguinte livro:

Fred Heeren; Mostre-me Deus - O que a mensagem do espaço nos diz a respeito de Deus

Uma requentada de O Universo Inteligente, de Fred Hoyle, e para variar, com os mesmo erros de sempre, só talvez, desta vez sem o autor ter direito a ganhar uma falácia com seu nome, coisa que no terreno das "ostras", corresponde a algo como o Nobel ou a medalha Fields.

Uma entrevista com o autor: Jornalista retoma em livro união entre ciência e fé.

Assim, sentemos a pancada nestes novos relógios de Paley, argumentos teleológicos, camada por camada, desde o mais amplo, do macro, até o mínimo.



Big Bang

Seguidamente argumentadores por teleologias aparentes pontam que o extremo equilíbrio das partículas na natureza, suas simetrias, e até mesmo cada um dos processos mínimos que produz a natureza desde seus mais distantes tempos - e aqui, não direi "iniciais", pois veremos que a coisa, em Cosmologia, é um tanto mais complexa - tem de ser ação de uma divindade consciente e legisladora dos comportamentos da natureza (e jamais Zeus ou Odin, nem mesmo Brahman, e sim, claro que o deus dos hebreus e o citado na Bíblia).

Noutras palavras, o Big Bang é aceito ou tem de ser negado, se ele não é o próprio teológico Fiat Lux.

Poucas coisas são mais tolas.

O Big Bang nem sequer é o fenômeno a partir do qual o universo inicia. O Big Bang é o processo no qual o universo está.

A divertida imagem que foi capa da SciAm, com artigo sobre as novas luzes com as quais a Mecânica Quântica tem iluminado a Cosmologia (Paul J. Steinhardt; The Inflation Debate - Is the theory at the heart of modern cosmology deeply flawed?; Scientific American; April 6, 2011).


Eu e você, você e as letras que lê agora em seu monitor estão num fluxo de espaço-tempo que se expande, e só se mantém na mesma distância, fora variações típicas dos "newtonianismos" (adorei este meu neologismo, juro!) como sua oscilação pela respiração, batimentos cardíacos e vibrações desde o alto volume das caixas de som do vizinho metaleiro até o caminhão que na avenida passa porque exatamente estes "newtonianismos" incluem o atrito de sua cadeira, a resistência de seus ossos e músculos e até a estrutura de seu prédio, junto com a Terra e a gravidade do sistema solar e da galáxia inteira e até do grupo de galáxias próximas; por outras vias de argumentos com os "maxwellianismos" (juro, não resisto a sito!) que nas forças eletromagnéticas mantém, na menor escala, junto com a gravidade, como diria um amigo físico, "toda a bagaça grudada".[Nota 1]

Isto tudo, pelo menos, por enquanto, vide Big Rip.

Podemos estar, na verdade, num processo cíclico, e nem mesmo, teríamos tempo (notem a ironia) para poder colocar uma divindade cristã que tome decisões e realize atos.

Portanto, não necessariamente necessitou existir uma luz que se faça, mas sim, existe uma luz que é, sempre foi, e sempre será, eternamente sendo absorvida e emitida por uma matéria que se modifica, se agrega e se transmuta, inclusive, em luz pura.

Mas claro que crentes achariam aí uma brecha para inserir sua divindade consciente, providente e em suma, infantil e primitiva.

Não devemos afirmar que a natureza possui suas simetrias (que nem são tanto simétricas assim, vide o modelo padrão) e suas peças funcionam conforme um habilidoso ao infinito e no ínfimo relojoeiro. Ao verificarmos o passado da matéria, que podemos averiguar até em laboratório nas colisões de alta energia, percebemos que as partículas apresentam um determinado "grau de sobrevivência", uma certa "seleção natural" (por favor, criacionistas: sem ter coisa alguma direta na expressão a ver com evolução biológica!), e teríamos a "era da matéria". Em sua cronologia em maior escala, o universo mostra ser o resíduo de um processo um tanto radical, que estaria agora em seu estado, digamos, mais ameno, de menos brutalidade de processos.

De certa maneira, diria que o "poço de lava" solidificou-se e agora cabe no buraco um pouco d'água formando uma poça, mas jamais afirmaria que existimos porque o buraco foi moldado por alguém.


Precipício antrópico

Não, você não leu errado e tampouco eu tenha bebido.

A maior versão da falácias da poça d'água é dizer que o universo existe com as características que possui para que nós existirmos. É como a tola pulga que jura que o enorme mamute é fruto de milhões de anos de evolução para que sua vida seja vivida sugando sangue da enorme criatura, junto com sua "pulgar" (hoje estou terrível!) descendência.

Infelizmente, a própria escala da pulga para o elefante é enormemente mais favorável que a do ínfimo sistema solar e nosso planetinha para a escala do universo (1 milímetro para alguns metros contra umas 5 horas luz para uns 78 bilhões de anos luz).

O universo, se tivesse seguido determinadas constantes mais fundamentais, poderia apresentar hidrogênio apenas na forma de deutério, com um nêutron a mais, hélio poderia ser reativo, e nitrogênio formar cadeias, e habitarem formas de vida em planetas não com químicas diversas, mas com físicas nucleares diversas.

Recomendo: December 16, 2009; Fevereiro 2010.

E estes mundos hipotéticos podem existir agora, simultaneamente com o nosso universo de hidrogênios simples e hélios inertes, moléculas de nitrogênio que não gostam de companhia e cadeias de carbono formadas a menor oportunidade, até em cometas e no vácuo sob intensa radiação. Noutras palavras, como citado no artigo acima: universos com diferentes leis físicas, em comparação ao nosso, ainda podem ser habitáveis.

Logo, uma argumentação por um princípio antrópico dito "forte", teleológico, é apenas um raciocínio da tola pulga, e um precipício por onde escoa a também tola água da poça falaciosa.

Existimos, e somos formados pela matéria do universo, na sua apresentação atual resultante de evolução em composição e densidade, fruto de suas constantes mais fundamentais, e nada mais podemos afirmar.


Ao que tudo evidencia, o universo não é feito "de e para" a matéria trivial de nossas galáxias, da pulga até você e a Terra e as estrelas, mas sim, esta materia trivial nas galáxias são ilhotas de determinada natureza em meio a uma enorme trama, como digo, 'esponja', de matéria escura, esta sim, senhora em peso do universo, e sua modeladora em maior escala.


Sobre matéria escura, recomendo: 

Nota 1: Noutras palavras, a pulga e o mamute, você e as pedras que foram atiradas por nossos ancestrais do alto de um rochedo para matar o mamute (acabando com a vida da feliz e egocêntrica pulga), e o próprio rochedo, são mantidos na sua escala pelas forças eletromagnéticas, e todos estes são mantidos juntos à Terra e esta ao Sol e sistema solar, e este na Via Láctea, e as galáxias ao nosso grupo local, pela gravidade, todos os grupos galáticos se afastam na maior escala por motivos ainda misteriosos de acordo com a Relatividade Geral aplicada e talvez todos se afastem sempre aceleradamente pela ditar energia escura ou "quintessência", no jargão dos cosmólogos.

Matéria escura como uma teia que contém a matéria "trivial", nas galáxias (Stephen Battersby; Giant ropes of dark matter found in new sky survey; NewScientist).


Artigos clássicos sobre o tema Princípio Antrópico:
  • B.J. Carr and M.J. Rees, The Anthropic Principle and the Structure of the Physical World, Nature 278, 605-612 (1979).
  • G. Gale, The Anthropic Principle, in Scientific American, September, 1981, p.154-171.



Biopoese

Com a palavra, Francisco, O Herege, personagem de mim mesmo:

Eis que os crentes dirão, até em desespero, que são fruto das mãos habilidosas de seu relojoeiro, que gritarei: INCAPAZ!, pois não pode fazer uma máquina que operasse e ainda opere por si. E dirão que tal se deu desde o arranjo das mais primitivas e simples moléculas da vida, e eu direi: IMPOTENTE!, pois não podem suas perfeitas e magníficas peças por si reunirem-se para construir um relógio. E dirão que todos os passos dos processos da origem da vida tiveram a ação de seu senhor, e eu direi: ATRAPALHADO! pois miríades, Avogádricos números de moléculas pereceram, formaram estruturas que liquefizeram-se e não prospreraram, e o dito senhor teu deus tem que corrigir suas ações? Não podem suas formas vidas seguir seus caminhos sozinhas? 

Sois pois, macacos pelados que julgam-se divinos, fruto da sobrevivência ao hostil mundo e universo, e não houve sobre ti uma única ação inteligente, só o desesperado e desesperante  fluxo de energia tentando se manter.

Palavra do Herege, palavra da salvação, volta e meia, saindo em pleno bar com criacionistas no bufetão.


Serei arrogante.


Acredito que pelo lado técnico e com minha face mais séria, praticamente esgotei dentro das minhas capacidades o assunto aqui:

Vida, um produto do universo, não um milagre

E corroborações a estas questões somente tem nos levado a entender que a vida seja um "geologismo":

Clareando as nuvens sobre Gliese 581g

E quando menos se espera, mais sólidas evidências surgem que "as moléculas se bastam":


A origem da vida: pesquisadores criam molécula de RNA auto-replicante

A natureza realmente conspira, e nos comunica pela ciência, que de coisa alguma mais necessita para ter-nos produzido que ela mesma.

RNA ("Was It the Origin of Life"? Biologists Create Self-replicating RNA Molecule; April 12, 2011 - www.dailygalaxy.com)

A formação da vida, desde a complexação em moléculas polimerizantes até as "colaborantes" e a genética do DNA de L.U.C.A. (o primeiro ser vivo, ancestral universal), é tratada no campo intermediário entre a geologia e a química, e até envolvendo a astrofísica na própria composição do planeta em sua formação no sistema solar, e constitui o campo intermediário entre a mais pura bioquímica e a biologia, no que se chama biopoese.

A biopoese não é um milagre e não depende de ação sobrenatural alguma, pois as potencialidades de tal estão presentes na natureza mais íntima da matéria, incluindo, sua instabilidade e tendência sob condições à complexação, somadas e "sob a luz" da abundante energia das estrelas e da geologia (em menor proporção), no nosso caso, nosso Sol.

E alerto: a posição evolucionista teísta não é nem de perto relacionada diretamente ou substituível pelo Design Inteligente.

Evolucionistas teístas acreditam numa divindade criadora da natureza e ordenadora das leis físicas, um "deus sustentáculo das regras do mundo", mas cuja atuação "providente" é indetectável, e é exatamente a dos fenômenos naturais.

Nenhuma afirmação de um evolucionista teísta irá contra uma afirmação científica.

Design Inteligente afirma que determinados processos bioquímicos são tão complexos que não podem ser realizados pelos processos da evolução biológica tal como descrito na teoria da evolução, e "portanto" (um non sequitur) são devidos à uma intervenção de uma entidade sobrenatural inteligente. É um argumento teleológico requentado, na verdade, o "argumento do relojoeiro". Por n vias é uma tolice.

E por favor, crianças, aprendam:

NÃO HÁ FRONTEIRA ABSOLUTAMENTE DEFINÍVEL ENTRE O QUE SEJA NÃO VIDA E VIDA.

Vida é apenas um conjunto de moléculas colaborantes com fluxo de energia, em rota de organização e sistemas contrária à entropia do meio (mas não no sentido termodinâmico, e sim no de informação) pelo aproveitamento da energia livre de Gibbs.


Um dos meus primeiros textos de divulgação científica, do qual muito ainda me orgulho:


Este mundo, o mesmo de todos os seres, nenhum deus, nenhum homem o fez, mas era, é e será um fogo sempre vivo, acendendo-se em medidas e apagando-se em medidas. - Heráclito de Éfeso



Evolução e os  argumentos de Hume


Toda argumentação do tipo "o beija-flor foi planejado para seu bico alcançar a profunda flor" (ou tolice pegajosa similar) é estraçalhado até os átomos, a meu ver, pela brilhante argumentação de Hume. Com a palavra, a simples Wikipédia em português:


  1. Para o argumento teleológico funcionar, seria necessário que só nos pudessemos aperceber de ordem quando essa ordem resulta do desígnio (criação). Mas nós vemos "ordem" constantemente, resultante de processos presumivelmente sem consciência, como a geração e a vegetação. O desígnio (criação) diz apenas respeito a uma pequena parte da nossa experiência de "ordem" e "objectivo".
  2. O argumento do desígnio, mesmo que funcionasse, não poderia suportar uma robusta fé em Deus. Tudo o que se pode esperar é a conclusão de que a configuração do universo é o resultado de algum agente (ou agentes) moralmente ambíguo, possivelmente não inteligente, cujos métodos possuam alguma semelhança com a criação humana.
  3. Pelos próprios princípios do argumento teleológico, a ordem mental de Deus e a funcionalidade necessitam de explicação. Senão, podemos considerar a ordem do universo, etc, inexplicada.
  4. Muitas vezes, o que parece ser objectivo, onde parece que o objecto X tem o aspecto A por forma a assegurar o fim F, é melhor explicado pelo processo da filtragem: ou seja, o objecto X não existiria se não possuisse o aspecto A, e o fim F é apenas interessante para nós. Uma projeção humana de objectivos na natureza. Esta explicação mecânica da teleologia antecipou a seleção natural, e é de se observar que um século antes de Darwin.

Assim, nunca podemos dizer que somos projeto, e sim, podemos ser resultado final de uma filtragem (obviamente, a seleção natural). Somos apenas umas bactérias, uns vermes, uns peixes estranhos, uns colocadores de ovos, uns roedores modificados (perdão, amigos biólogos, o argumento é didático, não técnico!), um lêmures mais hábeis, uns grandes macacos carniceiros, todos, sempre, sobreviventes.

Mas desejando acreditar que tal total de processos, até que levaram a tola pulga do lanoso mamute, a ter a vida feliz que tem (esquecendo o pequeno detalhe que o fim da era glacial e mais um determinado macaco pelado e suas lanças acabaram com sua feliz vida, começando pelo pulguento mamute), é fruto da ação de sua divindade consciente, esquecendo que tal mente não se justifica (a começar porque mente é fruto do evolutivo, e não o que gera aprioristicamente o que quer que seja - o mais contundente argumento,na minha opinião, de "Deus, Um Delírio", de Dawkins), recomendaria inicialmente Cândido, de Voltaire, que acredito que basta, e em casos mais radicais de otimismo pela condição humana, achando que a divindade fez o mundo perfeito e belo para que o habitemos, recomendaria, até para conhecer o demais macacos pelados e seus atos por vontade, meia dúzia dos filósofos do século XIX, destacadamente, Nietzsche.

E após isto, ir, aos moldes do recomendado pelo próprio Cândido, cultivar o seu jardim.





Ver o que está bem diante do seu nariz exige luta constante. - George Orwell



Extras


Proporção Áurea

Segudamente, encontro citações de criacionistas e outros crentes (sim, usemos esta palavra), afirmando que a existência da proporção áurea, especialmente nas estruturas biológicas (como as pinhas, conchas, flores, etc), seria uma prova a presença/ação da divindade (qual?) nos processos naturais.



Assim, primeiro, mostremos num artiguinho singelo, que poderá mais adiante ser grandemente melhorado, que tal afirmação nem matematicamente é sólida.


Impossibilidade da Natureza Produzir a Proporção Áurea Exata



Observação: x^y é x elevado a potência y e SQR x é a raiz quadrada de x.

Pela proporção áurea, se a está para b  como a+b está para a, fazendo a=x e b=1, temos que (x+1)/x=x/1 .'. (x+1)/x=x, temos

x+1=x^2 .'. (x^2)-x-1=0 .'. x={1 +/- SQR [1-(4*1*-1)]}/2=[1 +/- SQR (1+4)]/2 = (1 +/- SQR 5)/2

Onde temos que a única solução útil é (1+SQR 5)/2.

Assim, temos que phi é relacionado à raíz quadrada de 5, então, nos parece simples, verificar que phi ser racional ou irracional depende da demonstração de que a raíz quadrada de 5 seja racional ou irracional.

Por Euclides, supomos SQR 5 como racional, logo, razão de dois inteiros:

SQR 5 = a/b, onde a e b são inteiros.

5=(a^2)/(b^2) .'. (b^2)=5/(a^2)

Como b é inteiro:

(b^2)=[(5*c)^2]/5=25*(c^2)/5 .'. (c^2)=(b^2)/5

Assim, c tendo de ser inteiro, leva a

(c^2)=[(5*d)^2]/5=25*(d^2)/5 .'. (d^2)=(c^2)/5

O que levaria a se necessitar de um número infinitamente divisível por 5, o que é absurdo (descréscimo infinito). Assim sendo, SQR 5 não pode ser racional, e consequentemente, phi é irracional.

Observação: existe uma demonstração por aritmética modular muito mais curta e elegante, mas julgo a de descenso infinito de Euclides mais facilmente entendível e suficiente para nossos propósitos.

Assim, como um número irracional exige infinitas partições, não poderá ser representado por estrutura natural alguma, que sempre chega a uma unidade mínima, no caso do biológico, a célula, no caso do atômico, como nos minerais - e também destes o biológico, os próprios átomos.

Logo, as sequências de Fibonacci das reproduções celulares, que produzem pentágonos, pentagramas e espirais de proporções áureas são aproximações de PHI e nunca PHI propriamente dito.




Fazendo uma pausa, um excelente vídeo sobre a sequência de Fibonacci e a proporção áurea aproximada na natureza:

Cristóbal Vila - Nature By Numbers



Noutras palavras, as reproduções celulares, produtoras de estruturas pela sequência de Fibonacci tendem a phi.


Leitura recomendada:

Mario Livio; Razao Áurea - A Historia De Fi; Editora Record, 2006.
Mario Livio; Deus é Matemático?; Editora Record, 2010.

Razão e Proporção - matematicamania.wordpress.com

Um importante conjunto de apontamentos sobre esta questão, de certa maneira, ainda mais destruidores que este meu texto:

Kentaro Mori; “Nature By Numbers”: Fibonacci e a matemática como descrição do mundo

Neste texto, é citado e linkado o excelente: Nature by numbers. The theory behind this movie

E o simplesmente devastador: Donald E. Simanek; Fibonacci Flim-Flam

E jogando a pá de cal: O Mito que não vai embora - Tradução de artigo do Devlin's Angle, de maio de 2007

Perdão, não resisti.


OdC novamente



Na blogagem anterior desta série, apenas citei e não tratei dos ataques do senhor OdC a Newton.

Por incrível que pareça, o que virá a seguir seria dispensável, pois a Relatividade, a Cosmologia a usando, burlaram n dos dilemas com que se defronta a Física lássica, e até determinados paradoxos, como o de Olbers.

A fonte do "colar que virá": Nas origens da burrice ocidental

...a não ser por referência a um observador vivo dotado do sentido da temporalidade. 

Falso. A existência dos fenômenos independe da existência dos seres vivos que o observem. Uma obviedade, pois a vida é posterior a todos os fenômenos que a levaram a existir. Uma afirmação de uma entidade consciente que seja um 'observador universal', pode ser uma fé até honesta, mas não é uma conclusão lógica (na verdade, uma petição de princípio). Até em termos mais simples e curtos, a vida existe no tempo, e não o tempo é produto da vida (o que me parece uma obviedade escandalosa!).

Antes, o dito senhor afirma uma coisa perigosa:

...a eternidade do movimento e a lei de inércia - sem parar por um instante sequer para notar que eram mutuamente contraditórios...

Não são, no sentido prático. São colocados como postulados para a construção de um modelo físico. São frutos de uma observação experimental (e não existe, na verdade, outro tipo em ciência). Se existe um momento no passado no qual iniciam-se todos os movimentos, trata-se de algo distante o suficiente para estarmos, hoje, num estado que aceite este modelo. Por similaridade, é óbvio que os raios de luz oriundos do Sol saem da esfera/disco de projeção que ele é. Logo, formam ângulos. Mas para a escala humana, mesmo da Terra inteira (6378 km de raio médio), são considerados paralelos, e com tal aproximação, calculou-se já no tempo dos gregos o diâmetro da Terra.

Aqui, devemos apontar que um dos muitos méritos de Newton é colocar uma Física desprovida da necessidade de uma divindade, rompendo com uma "causa primeira" ou "primeiro motor", substituindo-as por uma sequência infinita (hipoteticamente) de enventos naturais.


Atrevo-me  dizer que algo similar faz com o espaço, colocando-o como infinito (ou pelo menos, com uma escala tal que possa ser colocado como 'infinito no prático') e desconsiderando o problema que não possuia observação que apresentava um limite para tal. De certa maneira, por estas duas coisas, tanto no que seria o teológico (crença de uma divindade criadora sem evidências) quando no observacional (não apresenta hipóteses sobre o que não tem evidências), tenho a ousadia de dizer que Newton é um dos primeiros cientistas a colocar algo que hoje chamamos hoje de demarcação. Newton foca-se em modelos de tratamento do natural, de seu comportamento, e não numa Metafísica de respostas últimas sobre o que seja o "tudo" e quando este se inicia.


Não há "estados" - seja de repouso ou de movimento.


Tanto há que mesmo considerando um postular movimento eterno, aquilo que em Física Clássica seria uma quantidade de movimento universal, esta quantidade de movimento não necessitaria ser distribuída entre todas as partículas do universo, mas poderia se concentrar entre uma e outras. Por exemplo simples, as bolas de uma mesa de bilhar não necessitam todas se mover, mesmo quando numa delas é aplicada a mais poderosa das tacadas. 

Aqui, o senhor OdC parece ter um grave problema com o que seja "referencial". Havendo duas bolas de bilhar soltas no vácuo do espaço, uma se aproximando (ou afastando-se) da outra, existe obviamente movimento de uma ou de outra, dependendo de qual tomamos como referencial (assim como indenticamente, existe repouso de uma), e podemos afirmar que existe movimento das duas, considerando outro referencial, mas percebamos que de forma alguma eu poderia afirmar que não existe movimento das duas, exatamente, e gritantemente, por haver aproximação (ou afastamento) das duas. Em Relatividade, se aprende que todos os corpos, mesmo num 'newtoniano repouso', estão em movimento, ao futuro, na velocidade da luz, pois o tempo, em Relatividade, é uma das dimensões.


Aliás, quando OdC achar que não existe o estado de movimento, alguém atire uma pedra na sua cabeça, talvez aprenda que a pedra (ou sua cabeça) não estão interessados em sua semânticas pobres sobre o que seja movimento e/ou repouso.


"Estado" é apenas uma impressão subjetiva que o observador, ele próprio envolvido no movimento geral, obtém ao medir os movimentos físicos pelo seu tempo interior.

Como sempre recomendamos aos idealistas, independendo da questão "vivo", tratada anteriormente: Chute uma pedra. O estado da pedra estar em movimento em relação ao seu sensível pé lhe mostrará talvez a mesma questão da pedra que atingiu sua testa, na questão anterior.
 

Mas realmente dá para rir da Nota 1, em História e pseudo-história da Ciência - I.

Existem pessoas que só aprendem física básica sentindo, como diria um determinado professor meu, "na carne".


Espiritismo

Uma coisa é clara: Quando o "espírito" sobe, sua qualidade desce. É inconcebível que grandes criadores de nossa língua, depois da morte fiquem por aí gargarejando o tatibitate espírita" (Léo Gilson Ribeiro, crítico literário, Revista "Realidade", Novembro, 1971, pág. 62).[Nota]

Coisa que me impressiona e já em sua própria natureza está a clara inocência, quando não xipófaga da desonestidade, dos espíritas é que seu mundo de psicografias se dá apenas no terreno da linguagem, em prosa e até pobres versos.

Jamais se estabelece a psicografia de níveis mais complexos e formais de linguagem, como a lógica, a matemática, a física, as ciências naturais em geral, a genética ou mesmo a composição musical.
Não se manifesta um grande ex-professor de física da USP, um geólogo contemporâneo de Dom Pedro I, um químico que foi aluno de Dalton, um dentre os inúmeros matemáticos que gerações de famílias remeteram ao exterior, onde eram obrigados a aprender línguas características da cultura da época, como o francês ou mesmo o difícil para nós latinos alemão - com grande peso nas ciências ditas exatas.
Nem mesmo uma mínima linha de álgebra. Uma única estrutura molecular. Um única partitura de um chorinho dos saraus de suas vidas carnais.

Quando enveredam por nuances de algo que se aproxime do científico ou do filosófico, o que vemos é a manifestação do trivial, da formação de secundário, da formação de básico de faculdade, ou mesmo o lugar comum de uma moral de livro de autoajuda impresso em "papel jornal" - cunhemos a expressão "Pulp Philosophy".

Pelo visto algo se perde entre os mais poderosos cérebros dos homens quando estes morrem, e fica, pelo visto, preso em seu corpo primata em decomposição, e talvez, apresente-nos os kardecistas (eles odeiam este termo, e por isso mesmo, o uso) que Kardec escondeu mecanismos por algum exótico e nebuloso motivo moral.

Todas as religiões devem ser toleradas, pois cada um de nós tem o direito de ir para o céu à sua maneira. - Frederico, O Grande

Nota: Para um tratamento mais contemporâneo da introdução do espiritismo no Brasil, vale a pena ler o grande Machado de Assis.





Tempo

Até as questões de "deus criou no tempo" (a partir de um momento, o fiat lux)  ou "criou o próprio tempo" (aqui, Agostinho certa ao dizer que o tempo nasce com a própria criação) são perigosas, assim como são perigosas determinadas afirmações mesmo dos mais céticos.

Apriorismos de tempo são lindinhos em Física trivial, como a da "astrofísica para baixo". Na maior escala, a Cosmologia, e na menor, a Mecânica Quântica, deve-se ter tremendo cuidado com o uso do tempo num sentido newtoniano, que na verdade, é kantiano.

O universo não existe no tempo. Ele produz o tempo, pois este é correlato com a expansão de sua métrica. Aqui, Leibniz parece ter sido muito feliz.

Assim, na singularidade que nos leva o Modelo FLRW, que é a aplicação da Relatividade ao trato do universo em sua maior extensão e comportamento, num determinado momento no passado o tempo deixa de ter inclusive nexo.

Cosmologias cíclicas tratam de universos que expandem-se e contraem-se, e nos pontos de intersecção da métrica com o "volume zero" e temperatura infinita, também o tempo "trivial" deixa de ter sentido, e tem-se de usar outras definições de tempo (e aqui deveria ter escrito "tempo", com as destacadas aspas), mais complexas, onde estes ciclos ocorrem.

A coisa não é simples, e não pode-se enveredar, nem para uma argumentação apriorística kantiana, nem para um simplismo de argumentos como os tomistas.

O tempo é dependente de massa-energia, dentro da relatividade, mas a energia não é dependente do movimento no sentido newtoniano.

Tanto que o universo, em seus primeiros instantes, não possuia movimento algum, e exatamente, já continha todo o seu arcabouço de energia, e disto, advém seu "bolsão espaço-temporal".

E mesmo assim, em cosmologias relacionadas com branas, não é ele que possui sua energia originalmente, mas as recebe do dito "toque" de tais branas (na verdade, ela surge, juntamente com o "ponto de toque", que é o universo).

Aqui, seguidamente, leigos até bem intensionados enveredam por afirmações perigosas em Física.

Li de um menino na internet:


Energia é movimento. Tempo, temperatura, decibéis, são medidas de movimento. 

Aqui, acabou-se, de "à força" (percebam a ironia), transformar um escalar em vetorial. Tempo não é uma medida de movimento. Ele pode ser associado, na sua medição pelo humano, por movimentos, basta ver o já multicentenário relógio de pêndulo. Tanto é, que movimento se dá na variação de um intervalo, em relatividade, que inclui o tempo, ou de uma distância, no tempo, em Física Clássica, e o primeiro é uma "correção" do segundo.


O ontem é história. O amanhã é um mistério. Mas o hoje é uma dádiva, e é por isso que se chama presente. - Mestre Oogway, a sábia tartaruga de Kung Fu Panda, em momento muito mais sério e profundo que alguns dos "revolucionários gênios incompreendidos" que seguidamente lemos ou ouvimos.



Aborto


Deixemos bem claro:

Sou completamente a favor do aborto desde que realizado dentro das N semanas atribuídas pela medicina como da "individualidade não existente" [Nota 2] na exata medida que o estado propicie a educação para a não concepção. Antes do aborto seguro, a adoção facilitada, no caso de gestação consumada, ligado à gestação segura e 'previdenciada' e com isto tudo, que ele possa ser descriminalizado para a mãe.

Antes de tudo acima, e mais um pouco, ser realizado em conjunto, vai continuar, como já citado, a lambança miserável que aí está, desde a menina pobre na aborteira da favela até a "patricinha" da alta sociedade, com sua mãe, se fazendo de "liga da senhora católica", e sob a lei, na verdade, cometendo um crime, junto com o médico coautor.

E a lei, em grande parte injusta, colocando todo mundo no que é chamado por alguns de "confronto dos absolutos", na maior parte, pelos "absolutos" serem definidos por dogmas religiosos, e não por racionalidade.



[Nota 2]: Vida existe nas células de sua boca que você expele quando cospe ou escova os dentes, nas cutículas que corta. O problema é que vida não caracteriza individualidade por si. Assim, a concepção, a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, constitui, pelas próprias células que a produziram, a continuidade da vida, mas não a configuração de uma individualidade, que só se dá pela formação dos tecidos cerebrais e início das sensações, que são o próprio funcionamento cerebral.


Um temerário paradoxo

Talvez, dos discursos em "duplipensar" do Herege.

Curiosamente, muito do que aqui escrevo nasce dos criacionistas, e estes, como sabemos, são imensamente formados por crentes de determinadas denominações religiosas. Afirmo que eles muito me propiciam diversão, e desta, muito didatismo em ciência. Chego a proferir a barbaridade de que nossos jovens e (entendam bem a expressão!) "interessados e esforçados ignorantes" podem vir a receber muito do que se origina do conflito da Ciência e Filosofia com os dogmas religiosos e determinadas teologias.

Em outras palavras, se não existissem criacionistas, teríamos de representá-los!

Mas cito um grande estrategista:

Não se deve pressionar demais um inimigo desesperado. - Sum Tzu
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