sábado, 26 de janeiro de 2013

Estrelas de préons

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A blogagem a seguir foi enviada por Heraldo Henrique, 19 anos, estudante de Administração de Empresas, estudante de Astronomia desde os 6 anos de idade, presenteado aos 9 anos com um telescópio, iniciado ao campo da Astrofísica e da Mecânica Quântica pelo livro "O Universo Numa Casca de Noz", de Stephen Hawking, e pelas aulas de seus professores de Matemática e Física, com vasto conhecimento de Astronomia, querendo cursar Astronomia e a procura do curso para trabalhar o mais rápido possível no ramo. Possui uma página no Facebook que trata do tema como o nome de "Eu estudo Astronomia".



www.dailygalaxy.com



Uma estrela de preóns é uma estrela compacta e muito massiva e densa, hipotética, feita de préons, um grupo de partículas subatômicas que teoricamente poderiam compor os quarks up e down e léptons e eventualmente compor a matéria escura.


www.thinnai.com

Estrelas de preóns teriam densidades muito superiores a do núcleo atômico, excedendo 10^20 g/cm³ [Nota do editor 1], sendo intermediárias entre estrelas de quarks e buracos negros. Uma estrela de preón teria uma massa comparável com a massa do nosso planeta contida totalmente em um volume de cinco metros, uma coisa muito difícil de se imaginar.

Elas poderiam ser detectadas por meio das lentes gravitacionais de raios gama.[NdE 2] A existência de estrelas de preóns poderiam explicar a discrepância que existe nas observações e nos cálculos que existem  sobre  a massa das galáxias que levaram à hipótese da matéria escura, que só é conhecida por interagir gravitacionalmente no movimento das galáxias. Também podendo ser candidatas a compor os chamados MACHOs ,que são objetos compactos e muito massivos que interagem muito pouco com o universo visível.
Estrelas de preóns poderiam ter se formado a partir de explosões de supernovas ou a partir do próprio Big Bang, mesmo que seja ainda assim difícil de explicar sua real formação física.

No contexto do modelo padrão da física de partículas, não há um limite superior preciso para a densidade de estrelas compactas muito massivas mas estáveis. No entanto, se num nível mais fundamental das partículas elementares existir, sob a forma de prisões, a estabilidade pode ser restabelecida para além deste limite de densidade conhecido pela física. Se sabe que um gás degenerado interagir fermionicamente admite ​​estrelas estáveis compactas, com densidades muito além de que em estrelas de nêutrons e estrelas de quarks. No universo, elas só perderiam para os buracos negros em densidade.[NdE 3]



Fig. 1.  Massa máxima e correspondente centro densidade ρ c de uma estrela de préon contra o bolsão constante B.[NdE 4] As linhas cheias representam as soluções gerais relativísticas OV, ao passo que a linha tracejada representa a estimativa newtoniana (Chandrasekhar). Apesar da alta densidade central, a massa destes objetos é inferior ao limite de Schwarzschild, como é sempre o caso para as soluções para as equações estáticas estelares. M ⊕ ≃ 6 × 10^24  kg é a massa da Terra.[Ref 1]




Fig. 2.  O raio máximo e os correspondentes três primeiros modos normais das freqüências de oscilação ( f 0 , f 1 , f 2 ) vs o bolsão constante. A linha cheia na figura da esquerda é o raio "aparente", como visto por um observador distante. A linha tracejada representa o raio de coordenadas gerais relativísticas obtido a partir da solução OV, ao passo que a linha tracejada representa a estimativa newtoniana (Chandrasekhar). Uma vez que o modo fundamental f 0 é real (wo^2), Estrelas de préons com massa inferior ao máximo são estáveis, para cada valor de B .[Ref 1]


Referências

1. J. Hansson, F. Sandin; Preon stars: a new class of cosmic compact objects; Physics Letters B.,Volume 616, Issues 1–2, 9 June 2005, Pages 1–7.
 

Notas do editor

1. Leia-se "10 elevado à 20a potência" ou mais no jargão da Física, "10 na 20".

2. O campo das lentes gravitacionais de raios gama é um dos campos de ponta da Astronomia com aplicações em inúmeras detecções de corpos extremamente massivos. Alguns exemplo:

3. A questão aqui pode ser objeto de interesse, e rapidamente, descobre-se não só sua antiguidade, mas sua profundidade: Limite de Tolman-Oppenheimer-Volkoff
4. O conceito de "bolsão constante" (constant bag), numa tradução deste, é bastante sofisticado, e sinceramente, não posso ainda escrever sobre tal:

Para leituras sobre isto, recomendo:
  • H.B. Nielsen; Approximate QCD lower bound for the bag constant B; Physics Letters B,  Volume 80, Issues 1–2, 18 December 1978, Pages 133–137
  • J.C. Caillon, J. Labarsouque; Density dependence of the MIT bag constant in a quark-meson coupling model; Physics Letters B, Volume 425, Issues 1–2, 16 April 1998, Pages 13–18 
  • Xuemin Jin and B. K. Jennings; Change of MIT bag constant in nuclear medium and implication for the EMC effect; Phys. Rev. C 55, 1567–1570 (1997)
  • E merecendo uma tradução deste:

    2.1 The MIT Bag Model - www-subatech.in2p3.fr

    The bag model provides a useful phenomenological description of quarks being confined inside hadrons. Quarks are treated as massless particles inside a bag of finite dimension. They are infinitively massive outside the bag. Confinement results from the balance of the pressure on the bag walls from the outside and the pressure resulting from the kinetic energy of the quarks inside the bag. The bag pressure constant, B, is related to the equilibrium radius of the bag:

    \begin{displaymath}B^{1/4}=\left( \frac{6.12}{4\pi }\right) ^{1/4}\frac{1}{R}\end{displaymath}

    For a baryon radius R=0.8 fm, B1/4=206 MeV.
    Inside the bag perturbative QCD applies. The total color charge of the matter inside the bag must be colorless, thus valid hadronic bags can only contain qqq and \( q\overline{q} \) states.



Extras

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Sobre préons, um interessante artigo de divulgação da Scientific American:


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Este editor é um colaborador intenso do artigo "estrela de quarks", da Wikipédia.

Estrelas de quarks são datas como "certas de existir", pelo simples fato que nêutrons, sabemos, são compostos de quarks. N natureza há partículas com mais do que os tgriviais três quarks dos bárions prótons e nêutrons. Quando de determinado tamanho, são chamadas de híperons. [Obs.: Recomendo do artigo Wiki em português rumar rapidamente para o em inglês, infeliz mas sinceramente.]

Assim uma estrela de quarke nada mais seria como que o "núcleo" de uma estrela de nêutrons, agora totalmente fundido e homogêneo em uma única partículas bariônica gigantesca, um enorme híperon.

www.astro.umd.edu




Lembremo-nos que da mesma maneira que estrelas de nêutrons tem "crosta" de matéria degenerada da mesma composição que estrelas anãs brancas, e sobre estas crostas ainda mais tênues do que seria matéria trivial ainda que imensamente comprimida (como a do núcleo terrestre, onde o ferro e o níquel passam de densidade de pouco menos de 9 para mais de 12 g/cm³). Estrelas de quarks teriam camadas de nêutrons, e assim por diante em camadas de menos ou mais densidade, de acordo o a distância do centro, e todos os corpos desta "família" teriam gradientes de densidade que formariam híperons de tamanhos diferentes.


abyss.uoregon.edu

Aqui, a questão hipoteticamente é simples de ser entendida. A questão complexa, e diria "mais espinhosa", é que estrelas de préons se baseiam em teorizações que ainda não possuem corroboração, de partículas que comporiam os quarks.




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Neste blog, recomendamos a blogagem:

Para um ilustração bastante completa da questão densidade nos corpos celestes, com introdução ao corpo hipotético "estrela negra", que poderiam "por si" ser uma mostra do ponto de "conciliação" da Teoria da Relatividade com a Mecânica Quântica.



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Sobre estrelas negras, na SciAm:


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Na poderosa Nature:



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Dado que nossa capacidade de contrução de aceleradores é limitada pela engenharia, pela economia e poor fim pelas próprias dimensões necessárias, a observação ainda que indireta de tais corpos celestes poderia ser o passo seguinte na Física:

 
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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Existe "Lei de Causa e Efeito"?





Uma nota inicial deste editor:

Republico aqui o excelente texto do físico Riis Rhavia Assis Bachega, mestrando em Física pela USP, publicado no site Sociedade Racionalista (sociedaderacionalista.org), com o qual pretendo iniciar uma longa série sobre os temas causalidade, determinismo, aleatoriedade, etc, e questões relacionadas que custam muito caro a quem pretende divulgar ciência em meio a uma série de vícios, desde culturais aos de origem religiosa, que impregnam o modo do humano médio ver a natureza.

Boa leitura.






A ideia de que eventos tem sua existência condicionada a eventos passados é muito forte na história do pensamento ocidental, com muitas implicações para a vida cotidiana, para filosofias metafísicas e esotéricas, assim como para a ciência. Então se cunhou a chamada Lei da Causa e Efeito, enunciada como: Todo evento ou objeto na natureza os quais chamamos de efeitos tem a sua razão de existência em eventos e objetos passados os quais chamamos de causas, todo efeito tem uma causa.


Esta ideia é tão dominante que já está incorporada em nosso vocabulário. Expressões como “por causa de”, “por que”, “segue-se que”, e outras evidenciam o raciocínio causal inerente a nossa linguagem. Escolas de pensamento metafísicas e esotéricas, entre as quais se destaca a aristotélico-tomista entendem a causalidade como uma propriedade inerente ao mundo físico, uma lei da natureza, a sacrossanta “lei da causa e efeito”.

Na filosofia de Aristóteles (394-322 A.C.) a ideia de causa é central, tanto que ele classifica as causas em quatro tipos: causa material (do que é feito o objeto), causa eficiente (o que faz o objeto), causa formal (qual a forma do objeto) e causa final (propósito com o qual o objeto foi criado). Como não poderia haver uma sequencia infinita de causas, deveria haver uma causa primeira ao qual Aristóteles chamou de “primeiro motor imóvel” e mais tarde São Tomás de Aquino (1225-1274) iria identificar com o Deus cristão. Vemos aí como a lei de causa e efeito é o pilar central do argumento cosmológico para a existência de Deus: Se tudo tem uma causa, logo o universo deve ter uma causa e essa causa chamamos de Deus.

Mas será mesmo que a lei de causa e efeito é uma lei da natureza, assim como as leis de Newton ou a lei da conservação da energia? Ela é inerente ao universo como alegam as escolas de pensamento metafísicas e esotéricas? A ciência depende do princípio da causalidade? Procurarei mostrar nesse texto que a resposta para todas essas perguntas é não!

Comecemos pela ideia de que a lei de causa e efeito se trata de uma lei da natureza assim como as demais leis. O que caracteriza uma lei da natureza é a nossa capacidade de testá-la empiricamente. Veja o exemplo da lei de Boyle para os gases perfeitos que diz que a pressão de um gás é inversamente proporcional ao volume. Podemos testá-la para qualquer gás que consideramos como aproximadamente perfeitos, e verificar (ou melhor, tentar falsear, mas isso fica para outra discussão) sua validade a partir de dados quantitativos. Como isso? Variando a pressão e verificando que o volume varia de maneira inversa, ou o contrário.

Mas isso não vale para nossa lei de causa e efeito, a qual longe de ser uma lei que pode ser testada empiricamente ela é uma tautologia, ou seja, um raciocínio que as premissas validam automaticamente as conclusões, em outras palavras, uma redundância. Veremos como: Ao nos depararmos com um evento ou objeto, já tentamos procurar causas para esse evento ou objeto, se conseguirmos descobrir a causa, ótimo, caso contrário se diz que a causa é “desconhecida”, mas nunca se aventa a ideia de que não exista causa. Portanto, o raciocino causal é um raciocínio circular. Ao assumirmos que “todo acontecimento tem uma causa” e “aconteceu alguma coisa aqui”, deduzimos “que o que aconteceu aqui tem uma causa”. Então vemos que a lei de causa e efeito ou princípio da causalidade, como você preferir chamar, não se trata de uma lei da natureza que podemos verificar empiricamente, mas antes um princípio metafísico pelo qual entendemos a sequencia dos eventos que observamos.

Vamos à segunda questão: o princípio da causalidade é inerente à natureza, sendo o princípio que revela o quão o nosso universo é ordenado e racional, implicando assim em uma mente que tenha ordenado o universo? Tal alegação das escolas de filosofia metafísica e esotéricas já recebeu diversas críticas, entre as quais não podemos deixar de destacar aquelas deferidas por David Hume (1711-1776).

Hume mostra brilhantemente como o pensamento causal não advém de princípios lógico-racionais, mas é mero fruto do hábito e costume. De tanto vermos eventos se sucedendo repetidas vezes, nos habituamos a entendê-los como casualmente conexos. Por exemplo: acendemos o fogo e sentimos calor, logo a causa da sensação de calor é o fogo; deixamos um copo cair e ele se quebra, logo a causa da quebra do copo é temos o deixado cair.[Nota 4]

Mas o que nos garante que esses eventos sempre se sucedem desta maneira, que sempre que acendermos o fogo iremos sentir calor, que sempre que deixarmos o copo cair ele irá se quebrar? Não existe nenhum raciocínio lógico que nos garanta que esses eventos citados sempre irão se suceder desta maneira, que sempre foi assim no passado e que será assim em todo lugar. O que temos é a expectativa de que ao acendermos o fogo sentiremos calor, ou de que deixarmos o copo cair ele irá se quebrar, e essa expectativa é criada a partir do hábito de vermos repetidas vezes esses eventos se sucederem da maneira descrita. Não há nada de racional no pensamento causal, ele é meramente fruto do hábito e, portanto não faz sentido dizer que ele é inerente ao universo, apenas uma maneira como nossa psique entende o mesmo.

Vamos à última questão, que será a mais demorada: a ciência depende do princípio da causalidade? Uma resposta provisória é que a principio sim. A teoria mais bem sucedida da história da ciência, a mecânica Newtoniana é assentada sobre o princípio da causalidade. A segunda lei de Newton ou lei fundamental da dinâmica nada mais é do que uma lei de causa e efeito. Ela é escrita da forma

                                   

e diz que a ação de uma força resultante sobre um corpo (causa) produz uma variação no estado de movimento do mesmo (efeito). Conhecendo todas as forças que agem sobre um corpo e as condições iniciais (posição e velocidade inicial) podemos resolver a equação e conhecer com exatidão a trajetória deste e assim prevê estados futuros. Com isso a ideia de causalidade fica atrelada a ideia de determinismo.

Temos então uma situação que deixou Hume muito desconfortável: Ele havia mostrado que a ideia de causalidade não é racional, mas apenas fruto do hábito, no entanto, a mecânica Newtoniana tida na época como o suprassumo da razão e que havia sido muito bem sucedida em explicar uma série de fenômenos era assentado sobre um princípio de causalidade. Como sair desse impasse? A resposta é que causa e efeito não é uma conclusão da ciência, mas um pressuposto desta.

No entanto, ela é um pressuposto que admite outros pressupostos. O primeiro deles é a de uma linearidade nos eventos. Vemos os eventos A e B se sucedendo linearmente e estabelecemos relação causal entre eles, chamando A de causa e B de efeito. Porém, para fenômenos cíclicos – e há muitos deles na natureza – essa ideia fica mal posta, uma vez que em um ciclo qualquer evento pode ser tomado como inicial e este coincide com o final. Vejamos o exemplo do ciclo da água: podemos perguntar o que causa a chuva. A resposta é as gotículas de água que precipitam na atmosfera. E o que causa as gotículas de água? A água que evapora do solo que precipita com a chuva. Ou seja, qualquer um pode ser tomado como causa e como efeito, eles se confundem e a ideia de causalidade fica mal posta em se tratando de fenômenos cíclicos.[Nota 3]

Outro pressuposto é que pra falarmos em causa, é necessário de falar em agentes causais. Na mecânica Newtoniana isso fica muito bem posto, no caso são as forças que atuam sobre o corpo. Mas na termodinâmica isso se perde, uma vez que tratamos de sistemas com um número muitíssimo grande de partículas, tal como um gás ou um sólido. Para esses sistemas, conhecer todas as forças que agem em cada partícula que os compõem é do ponto de vista prático totalmente inviável. Então substituímos a abordagem assentada sobre o princípio da causalidade para uma abordagem assentada sobre o principio da descritibilidade. A segunda lei da termodinâmica que pode ser enunciada da forma “o calor sempre flui do corpo de maior temperatura para o de menor temperatura”, em nada lembra a segunda lei de Newton, pois esta fala em obter estados futuros a partir do conhecimento das causas e condições iniciais, enquanto a segunda lei da termodinâmica apenas descreve uma tendência estatística que sistemas físicos se comportam. O calor até poderia fluir do corpo de menor temperatura para o de maior temperatura, no entanto isto é do ponto de vista estatístico tão improvável, que nunca se viu acontecer tal fenômeno. Reiterando, a termodinâmica ao contrário da mecânica Newtoniana não entende os sistemas a partir de um princípio de causa e efeito, apenas descreve estatisticamente como ele se comporta.

Outro pressuposto do princípio da causalidade é o de uma assimetria entre causa e efeito. O efeito depende da causa, mas a causa nunca dependerá do efeito, e isso se percebe claramente na lei fundamental da mecânica, a segunda lei de Newton: a aceleração que depende da força, nunca o contrário. No eletromagnetismo o que temos é uma simetria, pois suas leis fundamentais, as equações de Maxwell são simétricas. Elas nos dizem que uma variação no campo magnético produz campo elétrico e vice-versa. Dessa maneira, é perfeitamente possível entender o campo magnético como “causa” do campo elétrico e o campo elétrico como “causa” do campo magnético. Quem é causa e quem é efeito é uma questão que não fica clara. Novamente a ideia de causa e efeito está mal posta, portanto não é um princípio de causa e efeito que está por trás das leis do eletromagnetismo, pois elas são simétricas. Novamente o que temos é o princípio da descritibilidade.

E o pressuposto principal que contradiz ao raciocínio “tudo tem uma causa, logo o universo tem uma causa” é o da temporalidade. Para falarmos em sucessões de causas e efeitos, temos de admitir a sucessão temporal entre o que classificamos como causas e como efeitos. A noção de causalidade está submetida à noção de temporalidade, tanto é que no contexto da relatividade geral de Einstein, a maneira como se dá a relação causal entre eventos, ou seja, quais eventos podem ter conexão causal entre si e quais não, são dados pela geometria do espaço-tempo em questão, a isso se chama estrutura causal do espaço-tempo. E como isso implica no argumento cosmológico para a existência de Deus? Implica que é a causalidade que está submetida ao espaço-tempo, e não o contrário, e falar que o universo necessita de uma causa significa falar que o espaço-tempo precisa de uma causa, o que não faz sentido.[Nota 5]

Vimos que embora esteja fortemente presente na mecânica Newtoniana (o que não é de se surpreender, afinal a Europa estava recém-saída da Idade Média e o Tomismo ainda era forte), o princípio da causalidade perde força no decorrer do desenvolvimento da ciência, principalmente no contexto da termodinâmica e do eletromagnetismo e dá lugar ao princípio da descritibilidade. As leis não são mais enunciadas na forma “A causa B”, mas sim da forma “A evolui no tempo para B e essa evolução é descrita pela seguinte equação diferencial…”. Nem vou entrar no mérito da mecânica quântica em que não conseguimos falar de causas e determinação de estados futuros, apenas em probabilidades de obter esses estados. Ainda há uma discussão nesse âmbito, se o que há na mecânica quântica é indeterminismo ou incausalidade, ou as duas coisas. O certo é que mesmo no contexto da física clássica o princípio da causalidade perde um pouco da sua força, e, portanto ele não é tão fundamental assim para a ciência como se alega.[Nota 6]

E mesmo que se enunciem as leis da natureza da forma “A causa B”, elas já seriam leis de causa e efeito, portanto não faria sentido falar em uma “lei da causa e do efeito” que junto com as outras leis da natureza regeriam o universo. Ela é um princípio metafísico, não algo inerente ao mundo como alegado por escolas metafísicas e esotéricas, mas que tem sim enorme utilidade tanto na vida cotidiana como na ciência (muitas vezes obtemos soluções matemáticas para problemas físicos e as descartamos a priori por que violam o princípio da causalidade). Para terminar, cito David Hume que soube dar o devido valor a sacrossanta “lei da causa e efeito”, ao reconhecer sua utilidade prática.


O costume é, pois, o grande guia da vida humana. E este o princípio que, sozinho, torna nossa experiência útil…Sem a influencia do costume, deveríamos ficar inteiramente ignorantes de qualquer matéria de fato que fosse além do que está imediatamente preso a memória e aos sentidos.



Sobre o autor:

Riis Rhavia Assis Bachega é graduado em física pela Universidade Federal do Pará e atualmente é mestrando da Universidade de São Paulo.




Notas deste editor

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Um comentário meu que se perdeu na transmissão da página original:

Um complemento meu, que serve como "matando dois coelhos", é a questão de que um sistema em evolução, e destaquemos, como por exemplo o humano (seu corpo, nossas populações, nossa espécie), em sua evolução biológica, tem como efeitos de eventos do universo - e com este um todo - suas mutações*, mas tais eventos causadores não necessitam de forma alguma causa, pois na natureza, todo efeito tem uma causa, mas não necessariamente, seus eventos tem de ter causa.

* Não tenho hoje chifres pois tal modificação no passado não me foi herdada, e se tivéssemos evoluído de um proto-primata com chifres, por exemplo, da mesma maneira que ungulados como as cabras evoluíram de  uma separação dos roedores mais primitivos passando a possuir chifres, eu os teria, ou os poderia ter perdido ao longo da história.

Logo, a própria história do humano é uma sucessão de efeitos e eventos**, mas as causas que produzem tais efeitos, em miríade de eventos, não necessariamente tem causa.

** O fato de nós passarmos a ter certos dentes nos levou a certos hábitos de alimentação, e certos hábitos nos levaram a ter certos dentes. Este processo contínuo e sinergético (pois selecionante, em interação com o mundo) é muito mais determinante em nossa história que, por exemplo, a invasão da Ásia pelos helênicos. Logo, se a causa dos grande eventos históricos são os ainda mais remotos e profundos eventos evolutivos, as mutações e a deriva genética, por exemplo, são determinantes em nossa história, em muito maior intensidade. Logo, posso dizer com segurança que o acaso que produz as mutações, como objetivo aqui, causa os efeitos que são, hoje, eu escrever este texto.

Abordei a questão da aleatoriedade do universo e da natureza em sua intimidade como formadoras das coisas que hoje somos em Mutações, radiações e aleatoriedade.


Os eventos mais fundamentais da natureza, e esses são sempre de escala microscópica, são essencialmente sem causa de ocorrência, eles simplesmente ocorrem pois a natureza assim o é, sob todas as demonstrações de Lógica aplicada, evidências da Física de ponta e discursos da Filosofia contemporânea, e se por um profundo motivo não o for assim, de forma alguma tem de ser os moldes dos que querem dogmatizar uma causalidade absoluta aos moldes aristotélico-tomistas ao mundo.

Uma necessária causalidade para todos os eventos do mundo é apenas um senso comum, até evidências concludentes contrárias, e como muitos de sua espécie, um erro de avaliação de como a natureza se comporte.


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A apresentação de diversos outros argumentos sobre a não existência de causa alguma para os profundos eventos do mundo microscópico (evitemos o jargão "quãntico") ficarão para textos futuros, mas o básico está nesta nota e seus links.

Procurei tratar com algum formalismo e boas referências em português a questão da causalidade e da "aleatoriedade objetiva" como hoje vistas pela Física e Filosofia na Wikipédia em Acaso.

Sobre a afirmada "lei", Lei de Causa e Efeito, e ainda por cima afirmada como uma "Lei em Filosofia" pelos criacionistas e outros, contribui em Lei de causa e efeito., ali tentando salvar um artigo da Wiki simplesmente pernicioso, embora tenha somado na minha modesta opinião muito mais em Cinco Absurdos Argumentos Criacionistas - I.

Apresentei na releitura da A argumentação de Massimo Pigliucci as "causas aristotélicas" e sua relação com a refutação do chamado "Design Inteligente".

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Uma questão que já podemos tratar rapidamente aqui é que além dos processos cíclicos, uma argumentação de causa-efeito não é coerente nem útil com paralelismos de causas que ocorrem na natureza, e a argumentação aqui, embora pareça física, é oriunda da Filosofia.

Exemplifico e trato por duas vias o problema: Um dado ser jogado por mim é um efeito (sua queda) de minha ação, mas não causo a gravidade que faz cair, nem mesmo sou a causa de sua existência material - o dito dado, o objeto - que pode vir a ser fruto de um artesão. Mesmo o resultado não é causado por minha ação de jogá-lo, e sim dos fluidos envolvidos, uma borboleta voando gerando corrente de ar próxima e em última instância, da Terra que posicionou o piso onde terminará sua jornada naquela posição. Obviamente, a borboleta, o ar, a Terra não são causados por meu jogar o dado. As causas gerais do resultado são inúmeras, e não são relacionadas linearmente (o que concorda com o argumento de meu amigo Riis Bachega).


Por outra via, não se pode afirmar que a causa do resultado do dado ou, em exemplo mais dramático, da "bala perdida" que atinja uma cabeça de criança não é efeito de uma causa direta anterior - pois as demonstramos paralelas, como o próprio movimento da criança até o fatal ponto de encontro, e podemos fazer crescer o volume de causas até o dito "infinito" de Tomás e Aristóteles, e por isto mesmo não atribuir a "causa primeira" a um só ente, ato ou mesmo simples fenômeno. Em suma, o problema com este ângulo de análise do argumento da causa primeira é que parte do dogma que os fenômenos tenham de convergir no passado para uma causa única, o que não se mostra já no instantaneamente próximo, como as causas de um simples dado produzir um resultado, uma verdade.

Uma questão fundamental é a que na medida que não sabemos como é realmente o universo - melhor dizendo, o filosófico "tudo-que-existe" - em sua maior escala, nem mesmo em suas dimensionalidades (número de suas dimensões, se é que elas existem como nós entendemos), não podemos afirmar que ele próprio não seja fruto do encontro de duas causas/dois entes, ou mais, totalmente independentes uma da outra, cada uma delas elemento fundamental que veio a produzir o mundo.

Para entender o acima, alonguemos: um segmento de reta é o fruto do encontro de dois segmentos de plano, como dois quadrados, e um segmento de plano - o que eu chamaria de uma "lâmina" é o resultado do encontro das faces de dois segmentos de espaço, como dois cubos. Da mesma maneira, dois segmentos de espaço quadridimensional produzem na sua interface um segmento de espaço, e tal apenas pode ser imaginado por nossos cérebros - em operação limitados ao pensar tridimensional - por projeções tridimensionais. Um segmento de espaço quadridimensional - como é tratado nosso mundo pela Relatividade - seria conjectural e consequentemente o fruto do encontro de dois segmentos de espaço pentadimensionais. Mas da mesma maneira que o segmento de reta não é causa, e os quadrados não são uma causa, e sim seriam duas causas independentes, o nosso universo não pode ser afirmado como tendo uma origem una, pois há nas demonstrações de Aristóteles e Tomás uma clara petição de princípio (o ente que modifica o mundo que faz surgir tem de ser uno), fruto na verdade de sua maneira de ver o que seja o mundo, excessivamente euclidiana e evidentemente, no caso do pensador medieval, monoteísta.


Uma teorização sobre a origem do universo pelo encontro de entes de dimensionalidade superior às nossas "locais" é o cenário ecpirótico.

Ver também nossa blogagem: Pinceladas de Cosmologia em alguns de seus tons - Cenário ecpirótico


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A tese fundamental de Hume é que a relação entre causa e efeito nunca pode ser conhecida a priori, isto é, com o puro raciocínio, mas apenas por experiência. Ninguém, posto frente a um objecto que para ele seja novo pode descobrir as suas causas e os seus efeitos, antes de os ter experimentado e apenas ter raciocinado sobre eles. (…)

Ora isto significa que a conexão entre causa e efeito, mesmo depois de ter sido descoberta por experiência, permanece privada de qualquer necessidade objectiva. (…)

Que o curso da natureza possa mudar, que os laços causais que a experiência nos testemunhou no passado possam não se verificar no futuro, é hipótese que não implica contradição e que por isso permanece sempre possível. Nem a contínua confirmação que a experiência faz, na maior parte dos casos, das conexões causais muda o caso: porque esta experiência diz sempre respeito ao passado, nunca ao futuro. Tudo aquilo que sabemos pela experiência é que, de causas que nos parecem semelhantes, esperamos efeitos semelhantes. Mas precisamente esta suposição não é justificada pela experiência: ela é antes o pressuposto da experiência, um pressuposto injustificável.

N. Abbagnano, História da Filosofia, Volume VII, Editorial Presença - em paginasdefilosofia.blogspot.com.br



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Eu já confessei diversas vezes que não gosto de algumas abordagens do site Inovação Tecnológica, mas um artigo que pode ser útil para se entender a questão temporalidade numa abordagem de Física pode ser lido em "O futuro pode afetar o passado?".

O Livro "O Tecido do Cosmo", de Brian Greene, aborda longamente para leigos a questão de quanto nossa visão do que seja o tempo pode ser diferente do que realmente ele seja na natureza.

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Para as diversas questões da causalidade em Mecânica Quântica, recomendo:


E fundindo as questões da Filosofia desde Hume com a Mecãnica Quãntica, recomendo:

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